Não ao suicídio!

O que me aborrece é saber que não morri agora. Jamais interromperia o meu ciclo vegetativo. Não sou corajoso o suficiente para fazê-lo nem acharia justa tal atitude, mesmo não entendendo a razão da minha vã existência.

Sou ausente, desertor, inadequado, inapto, incoerente, inacabado, incompreensível, indotado, insensato, desagradável, inanimado, inapresentável, enfim, sou este ser sem nada a apresentar.

A solidão e os sonhos garantem a minha existência. Não tenho intimidades com as leis humanas, tampouco me convenço das leis divinas. Não há padrão de sociedade que se adapte ao meu modo indescritível de vida.

Mancho o vento com pensamentos e palavras. Sofro com o dia e também com a noite. Não há ser vivo compatível com tal monstruosidade.

Não permito que humanos curiosos penetrem no meu mundo nefasto. E se por teimosia ou ousadia penetram, faço-os perceber que estão num terreno movediço, conseqüentemente, perigoso. E aos poucos se afastam, conscientes da periculosidade que os cercam.

Não acalanto esperança àqueles que desejam me velar como a um amigo. Saberei sempre me refugiar nesta circunstância.

O que me aborrece é saber que ainda não morri.