Entenda...

Entenda...

Entender. Esse é um verbo interessante. Pela definição do Michaelis entender significa 1 Ter idéia clara de; compreender, perceber; 2 Ser hábil, perito ou prático em; 3 Crer, pensar; 4 Interpretar, julgar. E por ai afora. Mas quando a gente pede a alguém que nos entenda, estamos pedindo muito mais que isso. Estamos exigindo que o outro, como diria uma expressão em inglês*, calce os nossos sapatos, ponha-se em nosso lugar.

Isso é muito difícil. Principalmente se esse outro já vem machucado, surrado, escaldado. E ai é que o “bicho pega”. O entendimento – e não estou me referindo ao dicionário – fica praticamente impossível. Nada faz com que o outro calce o sapato* alheio e fica-se com a impressão de que nunca se chegará a lugar algum, principalmente se isso depender do bendito “entendimento”.

Mas acho que descobri uma maneira de fazer isso com certa eficácia, para atingir um grau bastante elevado de entendimento do outro (e de mim mesmo, arrisco dizer!). O sapato só consegue ser calçado se usarmos um tempero extremamente raro de ser encontrado: auto-análise. Absurda é a quantidade de pessoas que dizem fabricar esta iguaria e, no entanto, são somente imitações baratas da verdadeira essência. Ninguém consegue extrair a verdadeira auto-análise sem uma ferramenta precisa e microscópica chamada humildade. Ela deve ser sempre utilizada para que a auto-analise seja extraída sem prejuízos à fonte e ao meio. Um conhecido diz que usa auto-analise constantemente, como meio de se promover. Não sei de onde ele consegue tanta, mas tenho certeza que está comprando gato por lebre.

A fonte da auto-análise é outro assunto bastante difícil. Primeiro que nem todos dispõem de gabarito suficiente para discuti-lo. Segundo que quem o faz geralmente se confunde e acaba por demonstrar total ignorância sobre o assunto. E, terceiro... ora, todos têm a fonte, mas raros são aqueles que possuem a ferramenta adequada e o sabem explorar. Estou falando do coração. Esse que não é o órgão, mas uma fonte de calor abrasador, armazém de tristezas ou alegrias – às vezes ambos – e fonte viva da energia motriz da ferramenta humildade, tão usada em auto-análises e que nos torna o que somos.

Esse tal de coração é que, no fundo, nos faz entender. É ele que tem de estar presente quando precisamos calçar o sapato dos outros. É ele que move a mão da ferramenta humildade. É ele que segrega a especiaria auto-análise e faz com que sejamos e nos tornemos humanos e traz como conseqüência a compreensão. E como toda fonte, tem de estar cheio, vertente. O combustível? Amor. Só que notei uma coisa engraçada. Toda vez que ponho esse tal de coração para funcionar, e com a humildade tento extrair a verdadeira auto-analise, ele se aperta e vaza. Daí sai pelos olhos. E as pessoas chamam de lágrima.

*to be in someone’s shoes: estar na pele de alguém, estar no lugar de alguém. I should not like to be in your shoes / não queria estar em seu lugar.