AS DEVASSIDÕES - Berenice Hering

As mulheres vão ficando emburrecidas porque só se enolvem com sedução. Não é modernidade. É ancestralidade, é o DNA antropológico cobrando seu pedágio milenar. Armas sofisticadas para vencer uma batalha a cada vez, caçar e esfolar um javali por dia. Agora que não dominam mais a arte da magia, ainda crêem em poções do amor, simpatias, mandingas e sortilégios, chás alucinatórios, rituais, descarregos, o tarô cigano, trezenas e estocadas.

O foco da fêmea é direcionado para a procriação. O "arreamento", a montagem, a dança sensual, o perfume, os enfeites, a tinturação têm o endereço certo do acasalamento. Meninas, adolescentes, jovens, tudo bem. Os hormônios começam a ser secretados precocemente, agora por volta dos dez anos de idade. Início da escassez aos 45/50 anos. Temos aí uns 35/40 anos de ciclos férteis. Depois, com a TRH, pode-se alongar até não se sabe onde, mesmo sem ovulação e menstruação. O que modernamente se chama "menopausa ativa." Repor o estrogênio é complicado. O custo é maior do que o benefício. Há efeitos colaterais. O aumento de peso verifica-se rapidamente.

As amadurecidas, as que "caem na real", descem dos saltos e colocam os pés no chão, são umas chatas, as desmancha-prazer, a água fria na fervura. Quando arriamos a cangalha sedutora, a inteligência, a capacidade de análise, síntese e discernimento, formar conceitos, afloram com ímpeto e o universo se abre para nos acolher e compartilhar as dádivas do saber , sem discriminação. A tolerância zero nos segrega num gueto, pois as multidões estão nas arenas, circos, estádios e festivais. O dia do Halloween vira o Ano Sabático para todos.

A conscientização e o desvendamento do óbvio são um soco no estômago. As ninfas continuam correndo nos bosques à frente dos sátiros. Diminuem a marcha e sucumbem ao assédio. O objetivo desde os primórdios, a meta é alcançada, entra-se nas conformidade da "alavanca no seu fulcro". Polias e roldanas na engrenagem da capitulação.

Aposto que uma Lya Luft, uma Lygia Fagundes Teles, uma Maria Adelaide Amaral, uma Glória Perez, uma Fernanda Montenegro sabem do que estou falando. Esta alforria auto-conquistada não é uma Lei Áurea. Mas há coroas de folhas de oliveira e grinaldas de louros, até mesmo coroinhas de ramos de alecrim com que cada uma se enaltece e sobe ao pódio por auto-mais-valia e determinação.

A prisão da mulher é domiciliar. Agora vemos que a praga do Velho Testamento é eterna: "Parirás teus filhos com dores". Mesmo as que nunca pariram nem parirão, perecerão na tentativa, no jogo, no embate, no ensaio para a estréia, a reprise, o revival. Conti-nua-mente!

Devassar e devastar. Entrar em lugar proibido, vedado, ver o interior, tirar o privilégio de honra, escancarar as partes, corromper os costumes, prostituir, vulgarizar, tornar público, tornar dissoluto. Devastar é tudo do verbo anterior mais: destruir, talar, assolar, danificar. O homem-macho, no sentido antropológico e biológico é o que devassa e devasta a Mulher. Ela se prepara, ou melhor, sua natureza de fêmea desencadeia os atos e as cenas se passam, as peças se encaixam como no jogo de dominó, um castelo de cartas, uma escultura na areia da praia que o mar invade e desvanece. O engano pode virar desengano...

A isto se dá o nome de inexorabilidade, o que as teorias, técnicas e métodos educacionais abominam e desprezam, pois a Educação é sempre entronizada num podium de potência, abrangência e invencibilidade. O Ideal é o mais forte baluarte da Utopia.

O "tira" do filme serial-killer achava que odalisca é o mesmo que obelisco. As mulheres serão sempre as favoritas do sultão. Os homens, tirante os eunucos, são os pachás e marajás nos paços sitiados, com seus aríetes em desvios e desvãos, seus báculos episcopais em prontidão (se tudo for nos conformes) para as devassidões e imensidões...