Sem sandálias

É engraçado como simples cenas do cotidiano podem se tornar tão significativas em questão de segundos... Basta ficar em silêncio, numa atitude contemplativa, que passamos a perceber um mundo imperceptível para os nossos barulhos cotidianos.

Foi num desses momentos, indo para casa após um dia exaustivo - desses que nos tiram o fôlego – sabe, quando dezembro chega e a gente não vê a hora de descansar?! Pois é, as aulas já estavam acabando, e as reflexões apenas começando... Naquele dia, não fui à universidade, uma chuva intensa caía e queria me dizer alguma coisa, o entardecer foi dando lugar para uma noite nebulosa e no trajeto meus pensamentos estavam aflorados!

Comecei a refletir sobre o novo ano e os velhos problemas diários, pois o ano no calendário trocaria seus números finais em questão de vinte e tantos dias, mas os problemas... Ah! Esses continuariam comigo, e já no primeiro dia de janeiro – não, não, talvez no segundo! – estariam lá, me esperando para serem resolvidos. Mesmo depois dos fogos de artifício, da ceia alegre com a família, dos abraços trocados, dos telefonemas dados e recebidos, do beijo apaixonado do namorado, mesmo com toda essa felicidade da renovação, os problemas continuariam lá... ‘Que chatos!’ – pensei, e distraída pisei numa poça d’água, molhei a roupa e fui tomada pela raiva...

Porém, antes de mencionar palavras duras (normais a qualquer mortal em momentos de irritação!), fui surpreendida pelos risos alegres de algumas crianças... eram três meninas brincando nas poças d’água da calçada, elas pulavam felizes, molhavam seus pezinhos que estavam sem as delicadas sandálias, deixadas de lado sem o menor apego. Elas eram livres, seus risos inundavam meus ouvidos e sacudiam minha alma! A chuva estava forte e eu contemplava aquele instante tão especial totalmente fascinada. ‘Sem sandálias, elas vão ficar gripadas’ – pensei num primeiro momento, mas depois... ‘Sem sandálias, elas estão felizes, sem medo de viver, simplesmente vivendo!’.

Mas, o que isso estava querendo me dizer?!

Talvez que é preciso tirar as “sandálias”!

Isso mesmo! Sem sandálias, sem medos de enfrentar as complicações diárias – que, cá entre nós, todo mundo tem as suas!! – sem sandálias e sem neuras, sem besteiras, sem bobeira! Até nos dias chuvosos, nebulosos, preparados para a tempestade, eu e você, caro leitor, podemos ficar com os pés e a alma livres para viver tudo de bom e melhor que vier, resolvendo problemas, sendo dono da cena, mesmo sem sandálias, mas com mais paz no coração!

Lígia Pinto Rosso
Enviado por Lígia Pinto Rosso em 29/06/2008
Código do texto: T1057403
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.