Preconceito Inconsciente

   Estas narrativas são baseadas em fatos reais que aconteceram comigo. Isso mostra claramente nossos preceitos acerca de nosso eu. Formamos opiniões inconscientes a todo instante. Etnias. Classes. Religiões e etc. 
   Espero que os que me lêem possam refletir sobre a forma de como extinguir nossos preconceitos.
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   Trabalhava em Jurubatuba numa indústria de autopeças onde era estagiário. Tinha um amigo à época no qual éramos abertos um com outro e conversávamos acerca de vários assuntos.

   Um dia antes do ocorrido, falamos sobre o quanto éramos preconceituosos e não assumíamos claramente esta posição. O exemplo disso, sempre brincávamos com um rapaz de nosso departamento que era negro e constantemente falávamos piadinhas maldosas (“sem intenção”) do tipo “isso só pode ser coisa do negão” ou “ preto quando não caga na entrada caga quando saída”. E divagávamos acerca deste assunto porque apesar de amigos e não termos nada um contra o outro, sempre lembrávamos o fato do camarada ser de cor. Ele também não dava importância, sabia que aquilo era “brincadeira” e também sempre estava fazendo alguma graça ou zombando de alguém. Todos meninos mal intencionados querendo tirar sarro um do outro.

   Eu pegava o trem todos os dias e viajava cerca de 40 minutos e no fim da tarde ia direto pra escola. No dia seguinte após toda aquela reflexão, realizei meu trajeto cotidiano e na volta estava exausto. Trabalhara o dia inteiro e como era período de provas, havia dormido bem tarde. Também era um dia em que a empresa tinha realizado o pagamento de nosso salário e eu estava nessa situação, cansado, com o pouco de dinheiro que tinha pra me manter e reflexivo sobre o assunto do preconceito racial.

   Como todos os dias, caminhei durante uns 15 minutos até a estação e assim que ele chegou, adentrei-me no vagão, peguei minha mochila e coloquei-a sobre o batente da janela e estava disposto à dormir. Começaram a entrar pessoas dentro da composição e eu já sonolento, percebi que se assentara um jovem de cor ao meu lado e naquele instante, pus-me subconscientemente a preocupar-me com o dinheiro que carregava dentro da bolsa. Adormeci e entrei em sono profundo. 
   Sonhei, ali dentro, que estava cansado, sentado no banco do trem, com o rapaz de cor ao meu lado na pretensão em furtar-me e durante o trajeto, chacoalhava-me, colocando-me à ninar.

   Certa altura da viagem e com o furto preste a acontecer no sonho, o trem parou numa dada estação e apitou indicando a abertura das portas. Nesse instante o moço levantou-se do assento e naturalmente, resvalou levemente em meu braço. 

   Naquele exato instante me veio a informação cerebral de roubo, alarme de polícia, reação contra o larápio. Nisso acordei e me atravanquei com o rapaz dentro do vagão rolando com ele no chão. Sem entender nada o cara começou a gritar e me chamar de louco. Doido varrido. O que tinha acontecido. Eu extremamente envergonhado, olhei o parapeito da janela e vi minha bolsa intacta. Pedi-lhe desculpas e disse que sofria de “doença de cabeça”. Todos olhavam pra mim. Uns riam. Outros com cara de espanto, outros com dó e preocupação. Desci uma estação antes de tanta vergonha...

   Tento redimir-me sobre o fato. Como meu interior é vergonhoso e preconceituoso. Depois daquele dia, parei de chamar o rapaz de negão e hoje é um de meus melhores amigos.
Sidrônio Moraes
Enviado por Sidrônio Moraes em 28/06/2008
Reeditado em 11/04/2009
Código do texto: T1056026
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