TURISTA EM CASA
Sempre quando alguém me pergunta se eu conheço a Europa ou os Estados Unidos eu respondo que mal conheço meu querido Brasil. Pode parecer demagogia, mas meu sonho é conhecer meu Brasil. Quando estava nesse afã aconteceu a história que relato a seguir.
Há alguns anos fui a Santarém e de lá para Alter do Chão, na época uma linda comunidade à beira do rio Tapajós, distante cerca de 40 quilômetros da cidade, podendo ser alcançada por terra e por água. Estava lá eu, sozinho – só eu e Deus, como costumam dizer os cabocos da região – esperando o ônibus que me levaria até onde queria ir.
O ônibus demorava e demorava naquela terça-feira morna, quando ouvi duas moças conversando que estavam perdendo a melhor hora de sol nas praias de Alter e se tivessem um meio de dividir o taxi não esperariam mais. Meti-me na conversa:
- Quanto custa o táxi até lá?
- Cerca de cinqüenta reais, bem negociado - respondeu uma delas.
Propus que as duas fossem até o ponto de táxi e negociassem o preço, que eu pagaria vinte reais. As duas foram, jogaram seu charm em cima do motorista e conseguiram que ele cobrasse trinta e cinco reais. Ele ficou meio insatisfeito quando me viu aproximar, mas não estava estipulado que haveria um “tio” com elas. Nem que não houvesse. Assim fomos e chegamos ao lindo lugar, em torno das nove horas da manhã.
Não vou demorar-me em descrever as praias, com a ilhota em frente à vila, as límpidas águas do rio, porque isso merece um capítulo inteiro e mesmo assim deixaria de fazer justiça. É muito lindo e agradável.
Havia dois navios de cruzeiro atracados em frente a Santarém com turistas americanos e europeus. De um deles vieram seis ônibus lotados de passageiros. Do outro vieram um número considerável de botes com turistas que preferiram fazer o trajeto por água. Permaneceram por três horas na praia e depois voltaram.
Os turistas já tinham saído quando, em torno das 17 horas fui a um restaurante com as garotas – que a estas alturas sabia serem irmãs – comer um peixe frito. Minha aparência européia deve ter sido a causadora do que se seguiu.
Um motorista de táxi, que não era o mesmo que nos trouxera, mandou alguém falar comigo, pensando que eu fosse um dos turistas retardatários. “Contratou” um intérprete que, num inglês estropiado, veio me explicar minha situação e como ele tinha a solução para o caso. Para que eu não perdesse o navio que, segundo ele, partiria naquela noite, o amigo dele me levaria até Santarém por modestos cem dólares.
Notei que meu inglês era muito melhor que o dele me pus a negociar:
- Too expensive! I don’t have all this Money. May I pay by credit card?
A cada rodada de negociações ele voltava ao seu amigo que estava parado junto ao carro e voltava com resposta. O preço foi baixando, até chegar a cinqüenta dólares. Ele quase morreu de susto, quando eu, em bom paraês, falei:
- Maninho! A gente estamos pensando em ficar por aqui, hoje à noite. Têm umas pousadas simpáticas, baratinhas por aqui. Creio que vamos amanhã, de busão.
Já se passaram muitos anos, mas sempre quando alguém me fala em Alter do Chão, a imagem do “negociador” me vem muito viva à memória.