Pergunta perturbadora
A mais banal das perguntas: "você é casada?", é para mim uma fonte de perturbações prosaicas. Sim, podem ser triviais numa mesa de bar, especialmente se os que levantam copos são homens. Podem ser despidas de qualquer nobreza por senhoras respeitáveis que me fazem reparos, claro, para o meu bem e minha edificação. Sim, pode ser.
Para mim são pura poesia. Gosto dos homens, gosto imensamente dos homens e, parece-me, eles gostam muito de mim também. Quando me casei, busquei segurança e a minha garantia é que o par fosse apaixonado. É, fui sempre movida a paixão, mas desde que os outros a carregassem para mim e a eles fosse atribuído lidar com os espinhos e sofreguidão. Casei-me por ardil de um apaixonado, inconformado em me perder. E foi assim, dura e cruel a maior parte de nosso pouco tempo de união. Na dispersão é assim: o tempo sempre curto e intenso. Até o fim, quando voltei a bailar livremente entre meus irmãos e queridos, os homens! Voltando ao que mais me interessa: ah! os homens - os feios e talentosos, os belos e talentosos, os simplesmente belos ou feios, os vigorosos e os fortes, os delicados, requintados, os ricos, os poderosos, os pobres. Em cada um colho inspiração.
Ah, os homens! Com eles convivi toda a minha vida, meu irmão Carlos, que lindo homem! Meus primos, com quem eu vivia aventuras em jipes nos carnaubais e tantas mais aventuras, meu amado Heitor. Desabalados, embriagados, as gargalhadas. Sim, os campos devorados baixo as patas do cavalo, os entardeceres, as brisas, os feixes de raios de um sol afundando no oceano Oeste.
Amo os homens e quando descobri que por eles poderia me apaixonar, a largueza de meu amor foi pedra de tropeço. Aprendi que de nada adianta serem viris e belos, talentosos ou afoitos, insistentes e cativos de meus encantos. É preciso sejam bons, como meu pai foi um homem sobretudo bom. E ele permanece uma raridade, não os encontrei iguais por aí. Ainda assim, vis e viris, gosto de todos eles e por eles perco o rumo.
Quando escolhi conviver sem compromisso com a Irmã castidade, não foi de forma alguma por razões espirituais transcendentes ou sublimes. Foi simplesmente por necessidade de concentração nos ais por apenas um pelo qual me apaixonei. Mas fugiu, me rejeitou... Senti na pele o que tanto fizera sentir a meus amados varões. E então assumi que sim, amo os homens. E por amor a eles retirei-me para abrandar sofrimentos, economizar as dramaticidades das seduções, alcançar um lugar de autenticidade e assimilação de minhas fraquezas, de minha vileza, de minha pobreza, de mim, ai, eu...
Mas ainda assim, gosto dos homens e eles gostam de mim.