A ESCOLHIDA

Recebeu das mãos de Deus boa figura, inteligência, uma família grande, com pai, mãe e irmãos. Estudou em bons colégios e conseguiu se formar em uma universidade. Aparentemente esse homem tinha tudo para ser feliz. Encontrou uma mulher, no início da maturidade, de seu nível, classe social e planos de conquista. Era batalhadora e se apaixonou. Sonhou em fazê-lo seu companheiro e, com ele, constituir família. Ele, lisonjeado, insinua que no futuro, quem sabe, mudaria de idéia de ser livre e se comprometeria. Aquele não era o momento. Todas as oportunidades de se realizar emocionalmente lhe foram dadas e ele as descartou, uma a uma. Viveram juntos uma vida de aparências, sem profundidade. Ela sempre esperando que um dia ele caísse em si e visse o seu valor. Ele insinuava que ela era especial e logo dizia que era especial porque o escolhera. Era por vontade dela e não dele que permaneciam um casal, para os outros. Na intimidade era cada um para o seu lado. Um belo dia esta mulher conseguiu enxergá-lo por dentro, percebeu que sua juventude fora jogada fora e tomou uma decisão. Se permanecer juntos, ele dizia, era a vontade dela, separar-se também seria. Ela teve uma atitude enérgica e bombardeou todas as pontes que a ligavam a ele. Sumiu da vida dele, tomou outro rumo e, com força de vontade, perseverança e muita fé em Deus, refez sua vida. Construiu objetivos concretos e realizou sonhos até então impossíveis. Perto dos setenta anos, ela o reencontrou. Era um náufrago; debatia-se no meio das ondas e, mesmo vislumbrando a terra ao longe, seu nado não tinha forças suficientes para tirá-lo do lugar. Não avançava, não ficava mais perto da praia. Ela passava de barco nas redondezas e o colocou dentro. Lavou o sal de sua pele e deu-lhe de beber água fresca. Mas ele não agüentava mais e se foi... Ela, atônita, perguntou a Deus: "Por que me fizeste chegar neste momento, neste lugar, encontrá-lo e presenciar seu último sopro de vida?" Deus suavemente retrucou: "Não o amaste mais do que à tua própria vida? Não houve um momento em que te oferecerias ao sacrifício em seu lugar? Não esperaste por ele trinta anos antes de desistir? Era necessário que ele encontrasse um anjo em sua miséria e, na hora da agonia, tivesse o que lembrar de um romance, mesmo que um arremedo de romance. Eu tinha que procurar este alguém, e você foi a escolhida".

Gilda Porto
Enviado por Gilda Porto em 23/06/2008
Código do texto: T1047761
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