Aprendendo a Aprender
Aprendendo a Aprender
Porque é exatamente isso que acontece aqui. Ler é sempre um aprendizado. Escrever idem, sendo duplo, porque afinal se transcreve aquilo que se aprendeu, e talvez triplo, porque dizem que ao escrever aciona-se um dispositivo chamado memória mecânica, que ajuda a sacramentar o aprendido.
Então por aqui se lê e se escreve, ou publica, mas por conseguinte, se aprende.
Confesso que nesses 4 meses de RL inúmeras lacunas foram preenchidas na minha cultura. Inúmeras. De tudo o que é tipo. Confesso que muita coisa que eu achava que sabia se confirmou vento, visto que eu não sabia, apenas supunha. E supunha errado.
Existem autores/autoras que são verdadeiras fontes de sabedoria. Tem uma que leio regularmente, pois além da sabedoria ela possui o quesito indispensável: sensibilidade. Não sei se ela me lê, pois nunca comentou nada. Não me importo. Já ganho muito ao lê-la, verdade seja dita. Passei anos lendo Veríssimo, Drummond, Camus e nunca consegui comentar nada para eles. Tampouco eles bateram à minha porta para comentar os meus textos. Assim, condicionado estou, pois treino gera condicionamento e até bem pouco tempo meu condicionamento era fruto do treino “sem comentários”.
Pois por aqui existe interação, o que acarreta um novo condicionamento. Mas antes que o mesmo ocorra é necessário aprender.
Quando se estabelece, nesta confraria, uma medida de reciprocidade, começa-se ler com outros olhos. Uma coisa que aprendi foi ler não só os textos recentes mas antes, passear pela linha do tempo da escrivaninha e ver à quantas andavam suas expressões em águas passadas. É quando vislumbro um novo conhecimento. É a dinâmica do existir transformada em palavras. Se bem que, em termos de escrita, águas passadas flutuam noutra dimensão de tempo.
Autores e autoras aparecem e desaparecem. Um condicionamento que eu já conhecia de vidas pregressas, ainda que ninguém fosse autor ou autora. Portanto, um velho aprendizado desfilando por um novo caminho.
Quando me deixo guiar pela intuição tenho ótimas surpresas. Mas isso acontece também no mundo não virtual.
Cultura à parte, aprendo com as emoções e com os relatos das mesmas. Aprendo emocionalmente. Mais de uma vez fiquei com os olhos marejados ao ler um texto. Mais de uma vez fiquei impressionado. Aturdido. Pensei como é possível alguém escrever tão bem assim.
A simbiose do RL lhe confere uma humanidade inédita, ao menos para mim. E se é inédito, é aprendizado.
Volta e meia insiro um ou outro texto no site “tal”. Uma vez ao mês, se tanto, dou uma olhada no placar. Ocorre que a única coisa que o placar não me mostra é a possibilidade de interação. Não ganhando absolutamente nada, em termos monetários, aqui, ou lá, os ganhos no RL são, a meu ver, os melhores. Pois de que adianta ao autor ser lido, por trilhões: pessoas e dólares, e ninguém abrir a boca? Seja para espinafrar, para louvar ou até para lhe apontar coisas no texto que nem ele viu - isso no sentido de interpretação. O crescimento de quem escreve é proporcional à qualidade de quem e como ele atinge. Um texto lido por milhões - de mudos - deve ser igual a um texto na gaveta. Ou não. Pois não conheço toda a experiência. Conheço a parte do escrever e ninguém comentar, ganhando ou não com isso. Quando se ganha, pelo menos a desforra pode se traduzir num bom vinho ou num bom jantar, tudo dependendo do momento autoral.
Comentário no RL igual: também se lê e também se escreve, isso posto, dá-lhe aprendizado. Aos poucos vai se conhecendo mais o dono ou a dona da escrivaninha. Aos poucos estabelece-se uma amizade. A amizade recantista e todo o intercambio pode ser virtual, mas quem está na escrivaninha é real. Aprende-se, portanto, uma nova maneira no abordar, no conhecer. O nova, aqui, ganha a patente de um quase pioneirismo, se pensar na idade da internet.
“O rádio e a televisão trouxeram instantaneamente a voz e a visão de pessoas remotas ao convívio de milhares de ouvintes e de espectadores: as primeiras frágeis insinuações científicas de que o homem é espírito onipenetrante.” Paramahansa Yogananda.
Mestre Yogananda escreveu isso na década de 50, pouco antes de desencarnar. Internet ainda não era sequer uma nódoa no olhar da ciência de então. Assim, não seria de todo errado supor que por aqui participa-se de um experimento, de um teste, onde não só a escrita está em jogo como as relações humanas, num âmbito infinitamente superior que a vulga internet com seus 80 % de pornografia (dados de 2006). Também não se trata de um site dirigido aos fabricantes de motores de popa da região de Angra dos Reis. Nossas ações por aqui são subjetivas. É o lance da sintonia fina.
Crônicas, sonetos, pensamentos, artigos, resenhas, poemas, todos me movem. Alguns ficam em mim durante dias. O manancial expresso do ser humano em palavras, todos os dias, superando seu próprio crescimento em cada reflexão publicada. Ocorre que no RL o subjetivo ganha contorno e forma na figura do autor ou autora. Dá para perceber de longe a dinâmica de cada um numa qualidade de textos para mim imbatível. Na sinceridade a gente lê cumplicidade, sendo que o inverso dessa afirmação também é válida. Não é o ser escondido pela pretensa ou abundante cultura, batendo um martelo monótono no mesmo timbre o tempo todo. É a essência do escritor do principio ou meados do século 20. Ele ou ela ainda tinham, e muito, sua individualidade preservada, a grande mídia já mostrava suas garras, mas os valores estavam cada qual no seu lugar.
Também aprendo como os outros aprendem. Sendo, o ponto chave desta etapa, salientar a disposição de outrem em aprender. Essa disposição revela o melhor: fulano ou fulana não acham que sabem tudo (que é uma etapa da vida muito desagradável), e assim aprendem. Vejo o aprendizado deles nas suas crônicas, que não raro demonstram bom humor, nas mais diversas situações. Não raro sofreram infortúnios, mas perceberam, assimilaram, raciocinaram e escreveram. Eis um quarteto indispensável, ainda que poucos façam uso dele. Nele está, porém, a base. O assentamento desta casa chamada “literatura”.
E não se começa uma casa pelo telhado.
Encerrando o que me parece não ter fim, outro dia me deparei com a seguinte afirmação, extraída de uma placa na cidade de Nogales, México.
“A Literatura não é uma teoria.
Se você não tem a literatura, adquira-a.
Ao adquirir, leia. Depois de ler, viva-a.
Depois de vivê-la, compartilhe.
Porque ninguém pode dar o que não tem.
E ninguém pode viver sem se doar.”
Adoraria ter escrito isso.