E o Verbo se fez Carne

De como a Carne devolveu a regência ao Verbo

Convencionou qualquer coisa de inteligível, aprendeu a grafar, passou a viver em comunidades fixas, aprendeu a domesticar animais e a plantar seu pão e a dividi-lo e a explicar a natureza através de mitos. Terceirizou-se.

Ridicularizou o mítico, questionou a si mesmo, perguntou do mundo, pôs em cheque o visível, adivinhou o invisível, duvidou da existência, deu o Causal ao Altíssimo. Terceirizou-se.

Cantou aos céus, deitou-se às bússolas e astrolábios, imprimiu o sagrado com sangue, romanceou o opaco, rogou insurreições, ignorou verdades, incendiou as virtudes, dizimou espécies, reinventou a roda em anti-horário, quadriculou o Supremo, abraçou morais estranhas, crucificou oferendas. Terceirizou-se.

Gozou com o rígido, confeccionou nova ordem, entregou-se ao progresso, escreveu e leu e rezou e marchou em línguas tantas, manufaturou quitutes, desconheceu a ponta do nó, suou a vida e a morte, expurgou natos nus, ajoelhou em terras improdutivas, ordenhou enteléquias frias, robotizou a argila, postulou seus complexos, lutou pelo terço do dia, fugiu de casa a foguete, militou pela inveja, elegeu conjunturas, compreendeu-se só, arquivou o homem auto-suficiente. Terceirizou-se.

Esqueceu a função, competiu com a sombra, não viu Marte ao olho-nu, engarrafou o escapismo, quixoteou a ética, culpou o gem, enovelou o linear, casou com a virgem dos olhos de vidro, trapaceou o espelho, comprovou renda para adquirir liberdade sem limite disponível, indicou um psicotrópico, julgou-se máquina-bicho, injetou no ramo sintético. Terceirizou-se.