SOBRE BLOOM


          Nunca li James Joyce por completo. Por uma ou outra razão, li trechos de sua obra. Não tenho noção das causas, mas minhas preferências acabaram recaindo sobre outros autores, outros temas.Não saberia explicar o que senti quando terminei de ler Germinal.O mesmo para Fome, Luzia-Homem, O Estrangeiro, Por Quem os Sinos Dobram, A Paixão Segundo GH. Mas nada de Ulisses.

          Na semana passada, eu assisti, em vídeo, Bloom, um filme de Sean Walsh. Fui convidada a participar de uma reunião que consistiu de uma palestra sobre  Joyce: a exibição do filme e um debate. Isso aconteceu na Academia Campineira de Letras e Artes.A obra de Joyce é complexa, poucos a lêem, poucos a entendem. Até as duas especialistas que lá estavam disseram que nunca leram “Finnegans Wake” inteiro.Portanto, não tenho gabarito para discorrer sobre James Joyce ou sobre Ulisses. Mas assistir ao filme deixou-me algumas impressões.

          A leitura de Sean Walsh fala sobre sexo, sobre sexualidade, sobre diferenças religiosas, sobre sonhos, sobre perdas, sobre morte e suicídio, sobre rotina e fantasia, sobre imposições sociais; sobre o masculino e o papel do homem sobre o feminino e sobre o papel da mulher, sobre conquista, sobre sedução, sobre existir. Parodiando o título de um livro bastante conhecido, embora sem fazer associações ao seu conteúdo: o romance fala sobre a “insustentável leveza de ser.” E essa fala, esse discurso, é predominantemente um monólogo interior, uma viagem para dentro.

          Embora as posições busquem rigorosamente o equilíbrio, embora pareça, superficialmente que a tendência é reconhecer e mostrar o valor do feminino, ficou-me uma dúvida em relação a essa neutralidade... Porém é uma visão bastante aberta, reconhecidamente. Mas dessa viagem para dentro, o que mais me marcou, por despertar sentimentos afins foi a questão da perda do filho. Chega a parecer que o autor entre outras possibilidades, aponta para o fato de que a morte de um filho (nesse caso um filho homem), marcou o personagem definitivamente.

          Por mais que eu percorra os meus caminhos internos em todas as direções, não entendi até hoje por que a perda de uma filha (como no filme, um bebê recém- nascido), deixou em mim essa dor que nunca foi curada. Será o sentimento de impotência, a frustração de algo que não foi plenamente vivido e que temos de preencher apenas com a imaginação?

          Poderia ser também a incapacidade de viver no mundo real: lidar com o que não temos, por não saber fazê-lo apropriadamente com o que temos.
Nunca entendi direito a frase “deixar aos mortos que enterrem os seus mortos.” Quem sabe se eu fizer um cruzeiro interno, levando um tempo maior do que o de uma breve viagem, venha a descobrir que não posso encontrar nenhum tesouro. Como pode encontrar algum tesouro, uma criatura há já muito tempo morta?