O cuidador de borboletas

Existem momentos que transcendem o real, são os ditos momentos MÁGICOS. Este foi um desses raros instantes que atravessam a retina de olhos distraídos.

Um ser mitológico; alto, esguio, magérrimo, pele lunar, barbicha rala cultivada por certo de longa data, olhos... enormes! Cabelos como que desenham pequenos tornados. Eis a figura que procurava um lugar para a pequena borboleta, nem tão bonita, nem com atrativos redundantes. A cortina preta na lateral do palco serviu. Cuidadosamente a transferiu do dedo para o longo tecido negro. E foi para o palco: ser o não-ator. Brincou de ser velho, rasgou e jogou folhas ao vento, gritou, gemeu. Tocou o berimbau que não sabe tocar e cantou com os olhos fechados atrás da negra cortina.

Sandálias de couro que tentam prender ao chão, os pés levitantes. O que o olhar compenetrado vê? Faunos, fadas, monstros, fantasmas? O não-poeta escreve poemas; o não músico compõe e inventa melodias. Quisera sentir seus sentidos por um breve instante, aguçar olhos, ouvidos, tato. Ver, mastigar, engolir e ruminar o mundo.

Quem es oh figura enigmática? Pouco importa, ele volta a procura da borboleta, não está na cortina. Olhos percorrem o chão, as paredes. Nada. Por certo ela tenha voltado às suas flores, aos seus jardins coloridos. Meus olhos se deliciam e agradecem pela percepção da cena. E o ser que se define por tantos "não seres", resplandece sua plenitude por todos os poros.

Lígia Martins
Enviado por Lígia Martins em 16/06/2008
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