A LIGHT DESIGNER

Alguém pode me informar onde estão os amoladores de faca com seus carrinhos cujas rodas eram um tipo de esmeril? Por acaso alguém viu um consertador de guarda-chuvas por aí? Alguém pode me dar notícias sobre onde estão os consertadores de máquinas de datilografar? Cadê aqueles moços que, nas escolas, descascavam laranjas numa engenhoca que transformava as cascas em compridos fitilhos?

Depois que a Tramontina e a Ginso criaram facas amoladíssimas a preços módicos, os Tigres Asiáticos espalharam suas sombrinhas (não apenas) entre os milhares de camelôs, inventaram esse negócio ótimo que eu estou usando para escrever, copiar, deletar, salvar (e que dá para comprar em 24 meses), e, por fim, “bolaram” o espremedor de laranjas... muitas profissões antigas foram para as cucuias.

Em compensação, apareceram outras e entre elas os Light Designers. Vamos aprender a falar direitinho: LÁIT DIZÁINERRRR! Isso! Enrola a língua um pouquinho no “r” final. O que significa? Raciocinemos: Light é luz, Designer é desenhista, projetista. Eles sabem tudo sobre as varas onde ficarão os refletores dos teatros, os filtros, as cores e a intensidade necessária para transformar os ambientes. São artistas capazes de sensibilizar os espectadores de óperas, peças teatrais, shows e são, também, candidatos a morrer de fome em Linhares (e Vitória, também), porque não temos essa cultura desenvolvida por aqui.

Sabe onde obtive o meu vaaaasto conhecimento sobre essa profissão? Minha irmã Nandressa, artista plástica que trabalha com festivais de ópera em Manaus e Belém, morava em Belo Horizonte, trabalhava no Palácio das Artes, era auxiliar do cenógrafo Raul Belém e, também, da light designer, Telma Fernandes. Nunca ouviu falar dos dois? Menino, ele foi o cenógrafo das óperas Aída, Barbeiro de Sevilha e Turandot, ela era a iluminadora preferida da Carla Camuratti e outros famosos.

Nanda estava aprendendo que uma light designer tinha de gritar com os auxiliares coisas assim: “LEVANTA ESSA P. DESSE REFLETOR DA VARA 2!”, “BAIXA O STROBO DA VARA 3!”  “NANDRESSA, CIGARRO!”, “SOBE O REFLETOR DA 4!”, “NANDRESSA, CAFÉ!”, “FOCO, FOCO, FOCO!”, COLOCA O FILTRO CIANO 1.2.1!”, “ABAIXA UM POUCO, MAIS, MAIS, MAIS!”, “NANDRESSA, CIGARRO!”, “NANDRESSA, CAFÉ!”, “NANDRESSA, VOCÊ JÁ COPIOU MEU PLANO DE LUZ?”, NANDRESSA CIGARRO!”...

Parece que os light designers tinham de ter, além de uma voz potente, muita sensibilidade artística, uma insônia crônica, os dedos indicador e médio da mão esquerda sempre prontos para segurar um cigarro, o indicador da mão direita para apontar o que deve ser montado ou desmontado e um estômago que coubesse uns 05 litros de café por noite.

Numa madrugada, a Telma estava indo levar a Nanda em casa quando o celular da primeira tocou. “Atende aí, Nandressa!”, disse-lhe “delicadamente” a Telma.  Ao atender, ela ouviu o seguinte:
_“Telma, é o Jô Soares!”. Minha irmã ficou estupefata, pois ela adora aquele gordinho (acho que é porque é muito parecida com ele, no humor e no diâmetro), mas conseguiu balbuciar com voz, simultaneamente, aflita, ansiosa e alegre:
_ “A Telma está dirigindo. Eu sou a Nandressa, pode falar comigo, Jô Soares.” 
Então o Jô disse:
_“Nandressa, diz para Telma que eu estou enviando duas passagens e dois convites para ela e um acompanhante assistirem à última noite do meu show em São Paulo, e que se ela não vier eu nunca mais falo com ela.”

Ainda atordoada, minha irmã relatou o telefonema e ouviu de sua interlocutora:
_ “Não poderemos ir porque temos a luz do Barbeiro de Sevilha para terminar.”  Nanda sugeriu que mandassem a luz do Barbeiro ir para o caixa-prego, e insistiu:
_“Mas... Telma, o Jô falou que se você e sua acompanhante (e o dedinho apontava para si própria) não forem, ele nunca mais vai falar com você !”.

Após muita vã insistência por parte de minha irmã, ambas chegaram ao destino. A auxiliar abriu a porta do carro, saiu sem falar nada e, então, a light designer questionou:
_”Não vai dar boa noite não, sua mal educada?”
Nandressa replicou enfezada:
_ “O Jô Soares disse que nunca mais vai falar com você. Se ele não vai, nem eu !”

Desde aquele dia ela começou a prestar muita atenção no pessoal da iluminação de espetáculos, e começou a fazer um esforço enorme para aprender a fumar e a beber café.

Continuamos esperando o dia que o Jô irá descobri-la e enviar duas passagens para ela e uma acompanhante assistirem a um de seus shows.

Adivinha quem irá com ela? Eu, meu bem!!!!.