Por que não sou feliz com o meu país?

POR QUE EU NÃO SOU FELIZ COM O MEU PAÍS?

Há alguns anos atrás a miséria ainda grassava nos rincões perdidos do interior, a imprensa ainda era controlada pelo governo militar, os jovens que se formavam não conseguiam emprego imediatamente, mas, mesmo assim, tínhamos heróis que nos faziam felizes aos domingos, com suas conquistas esportivas. O nosso futebol se tornou tetra campeão do mundo, Ayrton Senna conquistou o tricampeonato da fórmula 1, a seleção de voleibol de Maurício, Carlão e Marcelo Negrão ganhava a medalha de ouro, nas Olimpíadas de Barcelona. O tráfico e os traficantes ainda não haviam constituído o Estado Paralelo, podíamos sair à noite, e a juventude curtia as baladas da ocasião. Eu tinha carro e o usava para ir a festas na Tijuca e voltava de madrugada, dando carona a amigos que moravam, como eu, na zona sul. As escolas funcionavam regularmente, sem greve dos professores, que recebiam um salário condizente com as horas trabalhadas.

Senador da República era uma figura impoluta, normalmente eram eleitos após os 60 anos, com os cabelos grisalhos, vestidos em ternos impecáveis, mas não de marcas conhecidas, feitos por alfaiates de fama e nacionalidade estrangeira. As crianças ainda brincavam na rua, em frente das suas casas e, os celulares não eram acessíveis a todos os bolsos. A polícia tomava conta dos bairros e usufruímos do direito de ir e vir. Os vizinhos eram conhecidos e se ajudavam mutuamente. A Justiça e os Tribunais exerciam o seu poder e, os “bandidos” eram condenados à prisão e cumpriam pena.

Isto tudo não é “história da carochinha” e eu vivi esse tempo. Posso afirmar: eu era feliz e amava o meu país.

Hoje a seleção brasileira perdeu para o Paraguai por dois a zero, depois de ter pedido, pelo mesmo placar, para a Venezuela, há uma semana. Na Fórmula 1 não há vitórias brasileiras e nem a esperança de termos um campeão mundial, como Piquet, Fittipaldi ou Senna. Isso está tão distante quanto o Olimpo. Os jogos do Campeonato Brasileiro me parecem peladas de bairro e não com jogadores “ ditos profissionais”, que ganham tanto quanto um professor catedrático da USP. As nossas personalidades ou “celebridades” são atores de televisão, que estouram pela aparência física, muitas vezes evidenciada nas revistas masculinas. Talento? É claro que não estou me referindo a gente do gabarito de uma Fernanda Montenegro ou um Milton Gonçalves, embora eles freqüentem também as novelas.

Estou decepcionada com a vida de hoje: violência, balas perdidas, poluição das praias, com esgotos vertidos “in natura” nos nossos mares, rios assoreados, estradas esburacadas, escolas sem carteiras e professores em greve, doentes superlotando as emergências dos hospitais, sem médicos ou atendimentos, etc. As manchetes dos jornais evidenciando os roubos públicos dos “nossos eleitos” e as nossas obras de arte sendo levadas, em plena luz do dia, dos museus onde estavam expostas. O Congresso apoiando o Governo e aumentando os impostos, que já estão em 36% do PIB. Um dos maiores do mundo. Com tudo isso, como podemos pretender ser um país desenvolvido?

Quando penso no que acabei de escrever, acho que a única forma de não desesperar é lembrar a grande aventura que foi a minha vida; as viagens e países exóticos que conheci; as amizades que colecionei ao longo deste tempo e o prazer que tenho com os meus escritos, meus discos e livros. E quem está entrando na puberdade agora? O que os estimulará a chegar onde eu cheguei? Qual será a mola que os fará levantar do “berço esplêndido” em que esperam o futuro?

Creio que só há uma saída: DEUS.

Gilda Porto
Enviado por Gilda Porto em 15/06/2008
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