O Valor Interior

Todas as pessoas gostam de valorizar o lugar onde moram ou trabalham, ou até as associações a que pertencem. Clubes de futebol são a expressão máxima. Basta um grupo de cinco pessoas da mesma empresa se encontrarem num final de expediente para estar formado o "time da casa". Logo vem o convite ao patrão para que patrocine a compra de uniformes e o time está apto a desafiar todos os quadros das empresas vizinhas. Se o grupo for maior faz-se um time de futebol suíço, futebol de campo, etc. Se o grupo é feminino o time é de voleibol, basquete, etc. E a união não se restringe às empresas. Ao contrário, todo e qualquer lugar que se preze deve ter sua agremiação. Os trabalhadores cansados encontram novas forças para jogar a "pelada" nos finais de semana, como fosse seu ópio, a descarregar as tensões e frustrações, proporcionando-lhes momentos de descontração e liberdade. Quando o bairro é muito grande formam-se os times regionais: "Unidos de Rua Tal" e "Garotos da Praça Tal", ou ainda "Cruzeirinho", "Vasquinho", "Expressinho", etc, e logo surge um organizador para o grande campeonato do bairro, de onde surgirá uma seleção com os melhores jogadores, que irá disputar o "citadino", provavelmente revelando craques para os clubes profissionais.

Mas os valores que unem as pessoas nas competições esportivas não são usados quando o assunto é profissional. No fim, o produto importado sempre é melhor que o interno. A galinha do vizinho sempre é mais gorda que a nossa. A polenta dos outros tem menos caroços que a nossa. A solução com "prata da casa" sempre é desprezada e procura-se resolver tudo com valores "importados". Se a necessidade é em uma empresa, busca-se no mercado. Se em um bairro, busca-se no centro da cidade. Se em uma cidade, em São Paulo. Se em São Paulo: Nova York, Boston, Londres, Paris, etc. O fato é que o desprezo aos valores internos é uma constante em qualquer segmento da sociedade.

Na verdade o problema é maior, em sentido amplo, que o singelo exemplo do time de futebol. Quando um pai diz a seu filho:- Você não é tão bom quanto o filho do vizinho, e nunca o será. - está destruindo toda e qualquer iniciativa do menino para superar seu "adversário". O que era um obstáculo a superar passa a ser uma barreira intransponível.



Quando você diz a si próprio:- Eu nunca serei melhor porque nasci, moro ou trabalho aqui (ou acolá), - está se colocando em posição de inferioridade, desprezando seu potencial e indo a nocaute antes do início da luta. Se James "Buster" Douglas pensasse assim, jamais subiria ao ringue para derrubar Mike Tyson. Foi preciso uma sobrecarga emocional - a morte de sua esposa - para que aprendesse que nada neste mundo é eterno, nenhum obstáculo é intransponível. E foi assim que derrubou o mito: superando suas próprias limitações. Ninguém nasce sabendo e as deficiências devem ser combatidas com muita dedicação, começando pelo diagnóstico correto das falhas, seguido de um trabalho eficaz para eliminá-las ou, ao menos, reduzi-las. Não se pode mudar para melhor sem saber o que está ruim. Não se pode melhorar sem saber a quem se comparar. Não se pode desanimar antes de começar.



Quando você diz a todos que as pessoas próximas a você são piores que as distantes, está desvalorizando a si próprio. Se você contrata um gerente para comandar uma equipe, na qual se destaca um elemento que poderia ser promovido, pode ter certeza de que haverá conflito em breve. E quem vai administrar o conflito? Você, é claro. Aí a solução é simples: ou espera para ver se a situação se acomoda (o que dificilmente acontece), ou demite um ou outro dos contendores. Quem perdeu? Você, é claro. Se os dois profissionais tinham condições de atuar na função pela qual brigavam, poderá o demitido colocar-se facilmente em outra empresa, de preferência seu concorrente, para mostrar a você que fez a escolha errada (e não adianta você dar más referências). Tudo por falta de visão sua ou falta de credibilidade, que esperava ter em casa um profissional pronto ao exercício de cargos superiores, sem nunca ter-lhe dado uma oportunidade. Confesse que você ficou surpreso quando viu o rapaz, que você julgava despreparado, enfrentar de frente, e com grande estilo, o superior que você contratou depois de tantas entrevistas e por salário bem superior ao dele. Confesse que você se enxergou no brilho dos olhos daquele jovem atrevido que você pôs para correr de sua empresa, e que agora reforça as colunas de seu concorrente. Chega de nostalgia! O fato é que cada um faz seu próprio destino e quem se atreve a remar contra a maré é empurrado para onde não quer ir - pensa você.

Assim acontece com nosso país. Outro dia li um artigo de um respeitado jornalista, que abordava a forma como nossos políticos e economistas são transmudados de intelectuais em idiotas, e vice-versa, no simples ato de entrar ou sair do governo. Ministros odiados, quando depostos, são convidados a ocupar altos cargos em empresas de renome, e a proferir palestras por todo o território nacional, e até no exterior. ex-presidentes da República são consultados sobre os problemas da Nação. Problemas que não foram capazes de resolver, quando ativos, talvez por falta de credibilidade, mas que hoje são as pessoas mais recomendadas para aconselhar o novo governo.



Minha gente (desculpem o plágio), se não acreditarmos que podemos superar a crise, se duvidarmos de nossa capacidade para resolver os problemas da população, estaremos condenando-nos ao fracasso. Estaremos entregando a vitória "de bandeja" ao nosso adversário. E nosso adversário, neste caso, é o subdesenvolvimento, o desemprego, a fome, a miséria. Quem é capaz de ver seu filho passando fome e ficar de braços cruzados? Mas você é capaz de ajustar os custos de sua empresa e demitir dezenas ou centenas de pessoas num piscar de olhos. Você é capaz de disputar queda de braço com o governo e aumentar seus preços sem necessidade. Você é capaz de queimar sua produção para ganhar preço. Você é capaz de vender sem nota fiscal para não pagar impostos. É claro que o governo é ganancioso, que os recursos não são aplicados com prudência e se prestam, muitas vezes, a sustentar funcionários-fantasmas e aposentadorias fraudulentas. É claro que o ascensorista do Congresso Nacional ganha mais que o seu gerente. Mas não é assim que você vai mudar as coisas. Outro dia um governador, ao negar o pedido de um grupo de empresários, que pretendia financiamento do governo estadual para a instalação de indústria em seu estado, foi surpreendido com a afirmativa de que deveria retribuir os investimentos feitos pelas empresas postulantes em sua campanha eleitoral. A resposta foi pronta:- Vocês não investiram só na minha campanha. Onde estão os números do investimento nas campanhas de meus adversários? - Estava certo o governador. As empresas investem nas campanhas eleitorais de vários candidatos, de preferência os favoritos nas pesquisas. Não podem perder. E o preço é bem alto. Se eleito, o candidato deve facilitar a vida de seus empreendedores, de modo que recuperem o capital investido, com muito lucro. Se no Poder Executivo as coisas funcionam assim, nos plenários a corrupção é bem maior. Cada eleitor que vende o seu voto não está prestando serviço a si próprio, mas a quem pagou pelo voto, ou seja, quem financiou a campanha. Quando se postula um cargo eletivo, a pergunta que se faz não é quais são as propostas do candidato, mas de quanto dinheiro dispõe. Sem dinheiro não se ganha eleição. As pessoas simples não votam em seus semelhantes, mas em seus desiguais. -Como vou colocar lá um ignorante como eu?- perguntam-se. Este pensamento até poderia estar correto, desde que o candidato tivesse um compromisso com seus eleitores. O voto não seria vendido, mas cedido. Se o candidato, eleito, não cumprisse seu compromisso, teria de prestar contas nas próximas eleições. Hoje quando um deputado diz que precisa consultar suas bases onde vai? _ favela, ao bairro? Não. Vai falar com seus patrocinadores.

É contra isso que você deve lutar. Quando disserem lhe que você não pode postular um cargo, um emprego, um elogio, responda com outra pergunta: - E o que é preciso para que eu possa? - Exija a resposta, e não se conforme se alguém lhe responder que o requisito é dinheiro ou sobrenome, coisas que você não tem. Vá em frente. Lute por tudo aquilo que quiser conquistar e, mais importante, aprenda a confiar a seus semelhantes os seus melhores elogios. Se não são os melhores, acredite que podem ser, e incentive-os a buscar esse crescimento. O homem sábio sabe fortalecer os fracos e enfraquecer os fortes. Você é a imagem dos que o cercam, e não vai a lugar algum sozinho.