Como Nossos Pais

Outro dia o meu pai nos contou de sua infância. Seus pais eram muito severos. O vô Janjão levantava e ia tirar leite da vaca. Ao voltar ninguém deveria estar mais deitado - se estivesse era despertado com uma boa surra. Vô Janjão era benzedor famoso na região. Às vezes vinham chamá-la tarde da noite e ele nunca se recusava a empregar o dom que Deus lhe deu. Mandava os filhos buscarem e arrearem o cavalo no pasto, que ficava bem longe da casa, a umas duas léguas. Não importava se era noite ou dia, tampouco se eram crianças de nove, dez anos de idade e tinham medo do escuro. Tinham que obedecer sem queixas e, se o serviço não saísse a contento, era surra.



Já a vovó não ficava para trás. Dava uma tarefa a um filho e, para marcar o tempo, cuspia no chão de terra batida. A criança deveria cumprir a tarefa antes que a saliva secasse. E olha que estavam no interior do Ceará, onde faz muito calor - a saliva devia secar bem rapidinho.



Essas atitudes grosseiras têm que ser analisadas num contexto social. Se para nós, hoje, soam como provas de baixo respeito humano, lá servia como lição de vida. O nordestino tem que ser forte, pois é um sobrevivente naquele lugar inóspito. Se for frouxo, morre. Essa foi a lição que meus avós transmitiram a seus filhos.



Depois de ouvir essas histórias de meu pai, consigo entendê-lo um pouco melhor. Ele nunca foi um pai de afagos e carinhos. Não me lembro de tê-lo visto brincando quando eu era criança. Mas também não lembro de ter sido agredido injustamente por ele. As poucas surras que me deu foram justas, de alguma forma as mereci, reconheço hoje. Como gesto de carinho lembro dele me ensinando a rezar, fazendo o sinal da cruz. Como descontração lembro que um dia, um dia só, ele ficou horas tocando uma gaita de boca.



Ele era polícia e eu, como criança, tinha um respeito enorme - pra não dizer medo - do policial e sua arma.



Mas é um exemplo de caráter e honradez. Só tinha o que podia pagar - quase nada. Não atrasava contas e nem as fazia se não tivesse certeza do pagamento. Não sorria para os filhos, mas mantinha a casa com muito esforço. Hoje é aposentado e vive modestamente em sua casinha na periferia. Cuida dos netos e joga dominó com os filhos nos finais de semana.



Quanta honra sinto em ser seu filho! Como pude acusá-lo de ser ausente quando estava trabalhando para nos sustentar? Como pude pensar que não se importava conosco porque, ao chegar de uma jornada massacrante de trabalho, não perguntava à mulher se o filho estava melhor da febre ou qualquer outra enfermidade?



Estas são as lições do homem simples:



1) Acorde cedo! O mundo pode ser muito severo se você ficar dormindo.



2) Não tenha medo de nada! nem de ser novo, nem do escuro, nem do imprevisto. O mundo não vai esperar você estar preparado para cobrar uma atitude.



3) Seja útil, rápido e preciso. O mundo gira muito rápido e não vai ter pena de descartar você.



4)Viva modestamente! não queira ter as coisas que sua renda não pode comprar.



5) Seja honesto! A vida vai cobrar cada promessa sua. Não prometa o que não puder cumprir.



6) Ame seus pais! Não importa o quanto eles o magoem, ame-os. Um dia você vai entender por que eles são tão duros.



7) Você não é melhor que seus pais! Não importa o quanto tenha estudado ou se preparado. Eles sempre serão melhores que você. Será um vitorioso se for igual a eles. A vida vai mostrar isso.