Modernidade

Desligue o celular por alguns minutos, se não for lhe pedir demais. As ligações não atendidas vão para a caixa de mensagens. Elas poderão ser resgatadas a qualquer momento. Não se preocupe, seus amigos podem esperar um pouquinho. Dê uma pausa. Sei que você pode fazer este sacrifício por mim, por você, por nós e até por eles.

Este aparelho “fascinante” nos leva de um lugar a outro em uma fração de segundo, nos faz acreditar que a distância cabe no compasso, que o caminhar não perdeu o passo, que o riso farto do outro não deixou de existir, que a voz do feio pode ser ouvida. Porém, tornamos prisioneiros de nós mesmos. Não conseguimos nos desligar nem quando tentamos dormir.

A infeliz da minha secretária disse que vai comprar um destes monstrengos pra levar pro céu quando se for desta para outra.

Sei que temos muitas vidas. Sete é um número muito pequeno, somos mais poderosos que os temidos “gatunos”. Quando olho para trás vejo que não estamos aproveitando as oportunidades. Vejo-nos, em verdade, como uns mortos-vivos. Somos ambulantes neste contexto, transeuntes preguiçosos, seres que pouco pensam ou nada ditam. Todas estas vidas que nos são dadas gratuitamente, estão sendo jogadas pela janela morro abaixo: uma após outra – efeito dominó. E ninguém fala nada e ninguém quer ouvir nada, a não ser através desses sofisticados equipamentos. Olho no olho, pra quê?! Isto é coisa do passado. A conversa ao celular fica no ocultismo, no disse me disse à distância. Pensando bem... o toque, o corpo-a-corpo, o apego, o aconchego e mais um monte de “êgosss” estão virando coisas do passado.

Não sei se você conseguiu se desligar enquanto lia os três primeiros parágrafos, acredito que não. Mas ainda há tempo, sei que você fará isto - por você, por nós. Só assim os seus amigos vão perceber que você existe, que você tem um nome, um endereço, um quê de pecado e não apenas um número que os colocam em contato cibernético a qualquer momento. Se você não permitir que eles o procure em outras circunstâncias é porque você não se sente importante. Se você não deixar que eles pensem em você, jamais saberão do seu paradeiro. Ser amigo não é estar disponível o tempo todo e nem a qualquer instante. Ser amigo é estar presente – mesmo não estando ligado. Ser amigo é ser diferente - não servil.

Ainda bem que não sei o número do celular de Jesus Cristo, quando quero falar com Ele, vou ao seu encontro, à sua casa. Abro a porta, puxo a cadeira, sirvo-me de suas palavras e companhia.

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 11/06/2008
Reeditado em 04/10/2017
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