A MÚSICA CLÁSSICA
Neste mundo de eternas emoções, temos muitos gostos e muitas formas de aguçarmos nossos sentimentos para podermos viver intensamente um grande momento. A música nos reserva boa parte do tempo que dedicamos ao sentimento, para expressar nossa riqueza interior, produzindo em nós noções de aconchego, de paz, de tranqüilidade e até de êxtase quando verificamos que um fato que poderia passar desapercebido, por ser corriqueiro e usual, transforma-se num turbilhão de emoções se com ele estiver acompanhada uma linda sinfonia.
Quando era mais jovem não dedicava nenhum momento de minha existência para ouvir a música clássica, pois a minha noção de musicalidade estava voltada para ritmos contundentes e dispercivos que denotassem alvoroço, algazarra, desprendimento. Buscava na música um forma de “balançar o esqueleto” conforme se diz na gíria popular. Não era uma dança, mas uma forma de transformar um momento numa dinâmica que ultrapassasse barreiras de relevância, como inserir-me dentro dos movimentos da época de minha juventude, até porque esses movimentos eram capazes de incluir ou abreviar no que diz respeito à proximidade com o moderno e com os hábitos de então.
Evidente que essa filosofia estava muito ligada à juventude e ao modismo que se instalava nas diversas fases de nossas vidas. Por isso entendo o jovem de hoje quando passam a assimilar alguns ritmos que a meu ver depõe contra as regras que deveriam fazer parte de uma boa criação artística. É por isso que vivenciamos o “Créu” fazendo sucesso. Críticas à parte. O que quero dizer é que a juventude encarna aquilo que lhe é peculiar como forma de transcender sua imaginação e sua inclusão no meio social.
Hoje vivo a fase da música clássica. Não porque sou cinqüentenário, mas porque também entendo que a vida é um aprendizado e quanto mais experiente somos, mais assimilamos aquelas emoções que simbolizam a riqueza de criação. Talvez até porque a música clássica demonstre – na sua essência – uma característica própria da reflexão, da capacidade entrínseca de viver intensamente os acordes de forma tal que a sinfonia se transforma num elemento de penetração da alma, levando-nos a transes diversos. Ouvindo uma orquestra tocando uma MPB, nota-se que saímos do ordinário da música, pois quando surge uma canção de renome no mundo artístico a admiração por essa música está relacionada mais pela sua letra do que propriamento pelo seu arranjo intrumental. Passando algum tempo, quando essa música passa a ser produzida por uma orquestra que produz a molodia e a sinfonia, observa-se que a letra não precisa ser cantada por alguém já que ela já se instalou em nosso subconsciente e vai sendo reproduzida dentro de nossa imaginação, ou seja, a música passa a ter conosco uma sintonia exclusivamente pessoal e nesse momento somos nós que a reproduzimos.
Evidente que não é porque passei a gostar muito mais da música clássica que me tornei um obssecado por sua execução. Pelo contrário, fiquei mais aberto para entender com maior amplitude uma música quando ela é executada, fazendo dela um contexto e não uma marca. Isso significa dizer que quando ouço uma música não fico ligado apenas no seu ritmo, pois quero explorar sua essência e seu significado de forma que possa penetrar nas suas metáforas para entender sua mensagem. É como a poesia, pois não basta sentirmos as palavras bonitas pronunciadas pelo poeta, por existir um significado que muitas vezes não observamos, mas que é necessário ser desvendado já que o autor espera exatamente isso de quem lê a poesia, ou seja, descobrir nas entrelinhas o que foi que o autor quis dizer com determinada idéia que foi pronunciada de forma indireta.
Esse também é o mistério da música. Compor a meu ver é um dom extraordinário, porque enseja no compositor dois lados subjetivos, um deles voltado para beleza das letras – a poesia – e o outro, mais importante, que são os acordes e os arranjos relacionados com execução das notas musicais a ser empregadas naquela composição.
Mas voltando à música clássica cito um exemplo que também me fez ficar ainda mais adepto de sua reprodução. Meu filho quando ainda estava no útero de minha esposa, tinha o hábito de ouvir música clássica. Explico: Quando estava se mexendo muito sua mãe, habitualmente, colocava sobre sua barriga um pequeno aparelho reproduzindo músicas clássicas. Ele parava num instante. Agente percebia que ele ficava ouvindo. Resultado, hoje quando ouve uma música clássica ele pode estar fazendo o que for que imediatamente ele vem até nós e exclama: - que música linda!
Enfim, esse é o sentimento que neste momento mais me parece aproximar de mim mesmo, ou seja, quando ouço uma música clássica. Mas, não ouso dizer que outras músicas deixaram de ter o grande valor, como as músicas regionais que nos aproximam de nossa origem.
O fato é que somos seres dotados de sentimentos e por isso cada um de nós – pelo nosso imenso leque de opções – a todo momento estamos ligados a uma música como forma de despertar nossa lembrança e nossa nostalgia. O que importa é que a música, independente de sua natureza, tornou-se num instrumento de nossa sensibilidade. Por isso não me julgo nenhum privilegiado com minhas opções, porque sei que todos nós, independente da idade, somos subjugados por um bom acorde e também por isso somos felizes, Graças a Deus!