JUS PRIMAE NOCTIS - (AS NOIVAS DE PRETO...) - Berenice Hering Berenice Heringer

Há 26 anos atrás usei esta expressão no poema Aura Medicritas (Mediocridade dourada), pág. 99 do livro Latin-Idade:...ele conquistou aquela aura fugidia de campeão olímpico /por instantes fugazes / volta a ser o síndico / com o seu jus primae noctis / dos tempos de antanho...

À época, já havia concluido o curso de Direito (1978) há três anos, mas perguntei ao meu professor de Filosofia e Sociologia, Dr. Antônio Lima dos Santos, ex-bispo baiano que abandonara a batina, o báculo e o barrete para casar-se com uma ex-freira, D. Maria, como era a grafia correta da expressão latina.. O romance deles deve ter sido tórrido...

Agora, pesquisando em 2005 para compor a obra Os Argonautas sobre a imigração alemã, tive de me inteirar sobre os pomeranos, considerados os pioneiros que vieram para o ES em 1847. Na realidade, foram os Heringer's os primeiros que vieram no navio Argos para o Brasil em 1824, durante o Primeiro Império de D. Pedro I. À chegada dos pomeranos já nascia meu bisavô João Carlos Heringer ali pelas bandas de Nova Friburgo-RJ.

Vamos ver então os pomeranos, originários da parte oriental da Alemanha, que após a derrota do III Reich foi dominada pelos russos. Hoje chama-se MPO, Meclemburgo Pomerânia Ocidental. Os que emigraram para o Brasil e ES em 1847 não o fizeram por motivos de guerra ou perseguição religiosa, mas única e exclusivamente por falta de terras, por recursos escassos, miséria mesmo. Eles têm a pele muito branca e até hoje conservam muitos hábitos e práticas oriundos de lá, mesclados com os adquiridos na nova terra. Além do vestuário, folclore, culinária, danças típicas, o que eles mantêm bem vivos e atuantes são os costumes regionais das bodas e festas de casamento. O Hochzeitsbitter convida parentes, amigos e vizinhos para o banquete. À noiva casta é permitido usar uma coroinha de alecrim. O pai da noiva recebe o casal à porta da casa e lhe oferece pão, sal e água acompanhados de uma bênção. Ao entrar na casa os convivas depositam uma moeda num prato, o Hochzeitsteller. Depois do almoço começa o baile, cheio de rituais. Todos dançam com todos. O noivo, com todas as meninas, moças e mulheres; a noiva, com todos os presentes do sexo masculino, o pai, o sogro, os irmãos, os cunhados, os convidados. Há o ritual da quebra de uma pilha de pratos de louça jogados ao chão. Eles dançam sobre folhagens, flores, ossos que os comensais jogam ao solo. A quebra dos pratos simboliza o rompimento com o velho e o começo de uma nova vida.

Antes, há alguns anos atrás, de acordo com a tradição da aldeia de origem, a noiva usava um vestido preto simbolizando luto e revolta, pois nas aldeias medievais era o senhor feudal o dono e senhor de todos os moradores da região que tinha direito à primeira noite com a noiva. O duque, conde, baronete, era o dono absoluto das terras e das vidas dos suseranos subjugados pelo poder da bota e do relho. Os mealheiros rendiam graças ao tirano, amo e possuidor de todas as regalias que reivindicava para si, como um merecimento divino. O hímen da noiva recém-casada lhe pertencia e era de sua competência e autoridade a inauguração. O himen-seu e não da donzela ou do noivo. O direito à primeira noite era privilégio concedido ao Senhor dono do Feudo e de todos os demais latifúndios.

Já pensou quantos bastardos semi-nobres gerados nessas noites orgíacas e abacadabrantes nesse cercalourenço em que o donzelo ficava de fora? Por isso o luto das noivas pomeranas. Por causa do Jus Primae Noctis do Senhor...

Vila Velha, 02 de junho de 2008.

Berenice Heringer
Enviado por Berenice Heringer em 09/06/2008
Código do texto: T1026018