A Favorita, o Texto e A vida

Estreou ¨A Favorita¨ e eu não sei do que se trata e nem quero saber. Vou na contra-mão da nação e não vejo novelas o que me rende uma notável ausência em assuntos tratados no íntimo de grupos cotidianos. Ficam a me olhar como se tratasse de um ser de uma outra dimensão, uma entidade vaga e vazia sem motivos para existir.
            O toque hipnótico da novela não me contagia e isso não é uma prova de superioridade, mas do meu desinteresse pelo andar da carruagem comum. Que assuntos podem trocar comigo? A literatura me isola da grande massa de amigos e parentes. Quem leu Brás Cubas? Coisa de colégio. Um amigo afirmou ao receber o diploma da faculdade que emoldurou e esqueceu em algum canto da casa: nunca mais pego em livro. Tratam a literatura como maldição e algo que foi imposto a criança para que desenvolvam sua capacidade. Depois da escola, crêem, não mais importam os livros.
            Felizmente, creio, muita gente não pensa assim. Quando voltei à atividade literária, perguntei a alguns amigos dentro de um carro, quatro doutores que podiam comprar livros: qual o último que compraram? O silêncio foi constrangedor. Em um país que não lê, os escritores tornam-se quixotescos.
            Minha letra não vende. Não procuro ser um ¨best-seller¨, apenas busco expressar minhas idéias e pensamentos tendo descoberto que uma infinidade de pessoas pensam de modo similar; o que foi grande alívio.
            Muitas vezes também me traio e fico semanas sem ler ou escrever. Volto ao real e então, após a hibernação, renasce timidamente a vontade de escrever, de ler e de buscar a expressão através dessa difícil arte.
            A minha necessidade é a de perpetuar-me de alguma forma. Desejo a luz das letras e a companhia de textos que me façam sentir leve e andar pelas estrelas.
            Queria não só escrever, mas escrever de modo a não deixar dúvidas sobre a minha capacidade.
            A perfeição não é uma meta, mas a razão de ser.
            Que gosto tem o vazio interior?
            A noção de que a vida passou é a pior possível. Observo olhos e multidões sorridentes, como se tudo fosse perfeito e eu fosse um desencaixe. Sabe aquela pedra nos rins que te incomoda? Qual a finalidade do apêndice senão trazer uma dor, um corte, uma internação e até a morte? O ser se lembra que existe algo que está além de suas forças e que pode derrubá-lo a qualquer momento.
            Este texto nasceu morto.
            Escreverei na ponta: você não devia ter sido.
            Se Clarice teve aquela vidência na Hora da Estrela, o último texto que coroou toda uma existência literária notável, devo, também, ao bem da literatura, encerrar essa busca e encerrar uma carreira que mal começou.
            Despeço-me até que venha o próximo recomeço.
            Queimarei todos os livros, todas as peças e não farei promessas.
            Quem pode censurar a mente livre?
            Viaje meu texto, viaje minha vida...