Infância

Ainda era bem cedo, o galo parava de cantar em cima do que antes devia ser um pé-de-fruta. O cheiro era da terra molhada pelo sereno. Era uma casa branca de janelas e portas azuis, escondida entre as árvores e flores. Viviam ali pai, mãe e três filhinhos.

E os filhinhos eram todos tão branquinhos e com cachinhos pretos colados na cabeça, uns caiam sobre os olhos e outros lhe escondiam as orelhas, a mocinha, já tinha uma lisura nas raízes onde nem laço de fita se era possível parar. Bernardo, Miguel e Maria.

Corriam ali pelo terreiro entre um pé de fruta e outro, sempre descalços, e brincavam de ir à lua riscando com tijolo toda a varanda um formato de foguete.

Andavam de bicicleta na chuva, e nas poças iam mais rápido sempre pra molhar Maria, que insistia em não conseguir equilíbrio nas duas rodas. Escondiam-se entre os moveis e quase matavam a mãe do coração, faziam guerras de travesseiro, estradas para carrinhos no quintal, subiam em árvores, desciam ribanceiras em folhas de bananeira, pulavam de um lado ao outro do córrego, depois de dias de chuva pescavam piabas. As terças a noite jogavam bocha, prefiram tomar banho na bica a tomar banho no chuveiro e nas noites de lua cheia sentavam-se na porteira pra ver as estrelas.

Montavam os três num cavalo só, o Pigmeu, e iam estrada afora com o pai. Na praça da igreja mercearia do seu Toin, era um suspiro pra cada um, e quando o dia tava quente por demais um picolé. Era assim todo sábado. Aos domingos missa bem cedo com a mãe, roupa engomada, cabelo penteado। Passava nem um minuto do fim da missa e os três se perdiam entrem os balanços da praça. De volta pra casa, pé preto no sofá limpinho. Tomavam leite comiam cavaco e iam se embolar no colo da mãe pra ver desenho. Era bom ver desenho com a mãe, melhor ainda são as histórias que a mãe conta da infância, sempre sofrida e sempre feliz.

De modo que por lá não tinha computador e os dias eram gastos uns com os outros.

E por modo disso eram felizes que dava gosto de ver.