DO ANTES AO DEPOIS - O DIVISOR DE ÁGUAS
cap I
O DIVISOR DE ÁGUAS
Estava exausta. A morte de minha mãe em dezembro de 1988, não apenas deixara em mim a tristeza, como também, uma sobrecarga de trabalho.
Como um sonho se realizando, eu cursava o 3.º ano do curso de Bacharel em Química Industrial, aos 30 anos. Com a luta intensa do dia a dia, cuidando de 2 filhos pequenos e de meu pai em sua casa, sem perder sequer uma aula do curso, não percebi a fragilidade em que se encontrava minha saúde. Em janeiro de 1989, veio a primeira pneumonia, mas não parei, tinha que continuar, afinal, todos ao meu redor dependiam de mim. Em março, a recaída, que me levou ao hospital por longos 11 dias.
Já recuperada, tentei colocar tudo em ordem, mas ainda fragilizada, volto ao hospital 3 meses depois, desta vez, com problemas renais. Após um tratamento não muito longo, eu me sentia bem e novamente com forças.
Em agosto, após uma noite de festa surpresa que ofereci a um amigo em minha casa, acordei muito cedo, sentindo-me estranha corri para o espelho... O susto foi tão grande que acordei a todos com meus gritos de horror. Meu rosto parecia o de um monstro saído de um filme de terror. Angina de Ludwig, este era o nome do monstro. Mais hospital, mais tratamento e, desta vez, com intervenção cirúrgica.
Enfim, um amigo de infância, médico, me ajudou a cuidar da saúde física e mental. Eu estava curada, forte e, apesar da saudade de minha mãe, feliz.
Aquele Natal, de 1989, seria de alegria, com uma árvore muito grande e decorada, cheia de laços e presentes, como minha mãe faria. Não haveria tristeza. E assim, eu e meus dois pequenos, preparamos tudo para receber 28 pessoas entre amigos e família.
No dia 23 de dezembro, pela manhã, comprando flores e frutas para decorar a mesa da ceia, senti uma dor no peito, que meu marido disse ser da coluna, pois eu havia trabalhado muito naquela semana. Voltamos para casa e resolvi descansar sobre as almofadas da sala de televisão e pedi para que minha ajudante fizesse algo rápido para o almoço, pois me sentia indisposta. Ela me perguntou o que eu sentia e nem pude responder, só gritava com a dor, novamente latente.
Ao ouvir meus gritos, uma vizinha correu para o corredor pedindo que eu descesse para que ela me levasse ao hospital. Entre a pergunta de minha ajudante e o momento da entrada no hospital, passaram-se apenas cinco minutos.
Primeiro eletrocardiograma: Absolutamente nenhum problema. Foi quando uma enfermeira, que eu conhecia desde criança, falou: “Ela é nervosa, um Buscopan vai acalmá-la”. E o residente que me atendia, não conformado com meu estado, pediu que trouxessem outro aparelho, pois aquele poderia estar com problemas. Veio o aparelho e, para minha sorte, o médico da UTI. Segurei as mãos de Dr Salles e com calma, já sem dor alguma, implorei:
“Estou morrendo, posso sentir, e se você não correr, vou morrer assim, em suas mãos”.
Segundo eletrocardiograma; nada me foi dito, e depois de algum medicamento que me foi administrado em uma veia do pescoço, só pude ver o teto do hospital que, sobre minha cabeça, corria... corria... corria...
EDITOR DE TEXTO: LEILA LAGE