As letras de Marília

Queria viver só das minhas letras. Estas letras dançantes como as de Marilia, estas letras divertidas que às vezes se unem em protesto, às vezes em casos bem contados, e às vezes em pura poesia.

Pena que não dá certo ao menos para mim (viver só de letras)... Pode ser que falte o patrocinador. Quem sabe as deixo repousar em lugares estratégicos onde poderá alguém muito distraído, absorto passar. Então, virão derrepente minhas letras e o derrubarão no chão e de pronto o tomarão de assalto, ele como refém não terá outra alternativa a não ser a de publicar-me (um belo livro, que fique exposto e fature dim dim).

Não acredito que não sejam boas as misturas de minhas letras. Não vou usar de hipocrisia bancando a falsa modesta. Todo mundo é capaz de fazer algo realmente bom. Se não hoje pode ser amanhã. Se não para um leitor, pode ser para outro.

A escrita casa bem com o leitor. Basta que se encontre o leitor certo.

Só que não da para viver de letras. Se ainda tivesse as rendas. Viver de rendas e de letras. Não as rendas das letras. Pelo menos não no começo.Mas as rendas de herança, ou de um marido rico. Pai político. Amante traficante... rs..rs..Credo !

Tem que trabalhar quando não está se escrevendo, isso é fato. Mas como trabalhar quando as letras dançantes ficam quicando bem na frente dos meus olhos? Me distraindo sem remorso? Me deixando sempre propensa a acidentes dos mais variados.

Diria que é diversão, se não fossem tão constantes os micos. Meu marido adora contar os meus micos. Se minhas letras não divertem, com certeza os causos contados em rodas de amigos tendo Simone como personagem principal certamente divertem alguém.

Reunião para as dez e trinta. Confirma e reconfirma. Tudo certo e planejado. Proposta de trabalho pronta para ser executada. Quem sabe mais um negócio fechado e um passo a mais na direção de viver de rendas e de letras?

A cliente abre a porta, sorrindo dá um beijo. O sol batendo no espelho bem em frente à porta de entrada.

Entrei entrando!! Sabe como é isto?

Fácil, você entra sorridente, cabeça erguida confiante e... E caí um tombo! Não enxerga o degrau (tem luz do sol cegando meus olhos de morcega). Depois ao tentar se recuperar do degrau, do salto da bota e da pasta que carrega. Escorrega no tapete (só podia ser uma armadilha já que o tapete não era nada aderente, tenho certeza, já que na saída escorreguei de novo) e vai parar em cima do biombo que separa os dois ambientes, recepção e mesa de reunião.

O biombo cai por cima da mesa de reunião ( só não assassinei a moça do cafezinho porque ela estava em baixo da mesa esfregando uma manchinha no carpete).

Tudo bem acidentes acontecem. Fui perdoada e ouvi mais ou menos por uns vinte minutos a cliente constrangida contando que várias pessoas já escorregaram ali, que ela vai tomar uma providencia, coisital...

A moça do café tratou de se mandar. Acho que ela pressentiu que ao servir o café eu ia derrubar o açucareiro bem no meio da mesa, e ainda por cima dos papeis a serem discutidos... Por que eu não aprendo a tomar cafezinho com adoçante? Pelo menos o estrago seria bem menor.

Depois disto só pensava nas minhas letras, no meu teclado e em contar como fechar um negócio depois de quase quebrar o biombo carérrimo de vidro da cliente, quase matar a moça do cafezinho e melecar todo o projeto (da cliente, o meu nem tinha saído ainda da pasta).

Bom ,cheguei chegando. Mas sai bem com apenas um leve escorregão no tapete . E com mais letras ainda a balançar bem na minha frente...

Marilia olha o que você faz com tuas letras travessas!

As minhas ficaram com ciúmes e de pronto quiseram aparecer aqui no Recanto.

Imagina se um dia elas se encontram? Que será que vão aprontar?

A Marilia de Pouso Alegre com suas letras beijoqueiras encontram a Simone de Porto Alegre e se põem a fazer travessuras por todo o lugar!! Ia ser mesmo de matar!!!