ALL YOU NEED IS LOVE

PARA EMILY, ONDE QUER QUE ELA ESTEJA

Nelson Marzullo Tangerini

Naquela tarde de outono, uma rádio fm especializada em músicas da década de 60 tocava Wichita Lineman, uma bela canção do maestro Jim Webb, cantada por Glen Campbell.

A velha canção me envolveu de tal maneira, que ficou ecoando o dia inteiro dentro de meu pensamento, fazendo-me lembrar de Emily, minha primeira namorada, My first love. Acabei, por fim, sonhando com ela. Sonhei que aquela menina dos 60 me visitava.

Nossa canção não era Wichita Lineman ou McArthur Park, de Jim Webb; não era And I love you so ou Castles in the air, de Don McLean; não era Crying, de Roy Orbison; nossa canção era If, do Bread David Gates.

“Se um homem pudesse estar em dois lugares ao mesmo tempo, eu estaria com você: amanhã e hoje”.

“Certas canções que ouço” são a trilha sonora de um filme de minha vida.

Caminhei pelas ruas de minha cidade pensativo, enquanto Wichita Lineman ainda permanecia no meu pensamento...

Lembrei-me de quando passeávamos de bicicleta, certa vez, com amigos pelas ruas do bairro e a corrente da bicicleta de Emily saiu e fui socorrê-la. Ficamos só nós dois. Os amigos se foram em suas bicicletas. Naquele momento percebi que estava apaixonado e nos beijamos...

E acabo me encontrando com a tia de Emily num banco.

Fico sabendo, pela boa senhora, que minha primeira namorada, mora numa cidade do interior de São Paulo e que está casada.

Tive vontade de revê-la, de tornar a ouvir a sua voz. Simplesmente para revisitar aquele belo momento que se foi.

Enviei, então, um livro meu, com meu telefone, para a rádio da cidade onde ela mora e pedi que a entregassem.

Era domingo. Estava em casa. O telefone tocou. Minha mãe atendeu. Era Daisy. Falou com Dinah por alguns breves minutos. E então pude ouvi-la, depois de anos.

Sorte minha: ela trabalhava na rádio.

Conversamos cerca de vinte minutos e ela me disse que ainda se lembrava de mim, principalmente quando ouvia If, e que tinha três filhas... Mas... pediu-me que não voltasse a escrever-lhe, porque seu casamento estava em crise.

O lp Ram, de Paul McCartney, recordo-me muito bem, nos servia para passarmos cartas de amor um para o outro, uma vez que seu pai não ia muito com minha cara. Quando escuto The back seat of my car, é de Emily que me lembro.

Quando terminamos, And I love you so, de Don McLean, foi a minha canção predileta. As pessoas me perguntavam como eu estava naquele momento e eu as dizia que não sabia o que dizer.

Em 2006, percebi que Emily havia entrado em meu Orkut para bisbilhotar minhas fotos. E achei ótimo, porque ainda há carinho e respeito em nossos pensamentos.

Também bisbilhotei as fotos de Emily em seu Orkut. Fiquei horas admirando seu rosto envelhecido e percorri momentos bonitos e bons de nossas vidas.

Talvez ela também tenha ficado horas em frente às minhas fotos, pensei, vendo meus cabelos brancos, a minha calvície, as rugas que o tempo me deu.

Emily hoje é uma linda senhora. Seu rosto se parece com o de Irene Ravache. Há luz e serenidade em seu semblante.

Ao rever Love story, filme que assistimos juntos, nos longínquos anos 60, foi de Emily que me lembrei, porque a atriz do filme se parecia muito com ela.

Bombardeado pela mídia, que nos trouxe de volta o Maio de 68, resolvi escrever esta crônica, ao som de All you need is love e She is living home.

Bons tempos...

[Emily é nome fictício e faz alusão a uma canção da dupla Simon & Garfunkel]

Nelson Marzullo Tangerini, 53 anos, é escritor, jornalista, poeta, compositor, fotógrafo e professor de Língua Portuguesa e Literatura. É membro do Clube dos Escritores Piracicaba [ clube.escritores@uol.com.br ], onde ocupa a Cadeira 073 – Nestor Tangerini.

n.tangerini@uol.com.br, tangerini@oi.com.br , nmtangerini@yahoo.com.br

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 02/06/2008
Código do texto: T1015567