Três visitas
Esta manhã, um gélido ar trouxe-me à lembrança as cenas desenhadas por Juan Ramón Jiménez no livro "Platero e eu", onde o autor fala dos dias que passou com seu burrinho Platero em Moguer, uma vila da província andaluza de Huelva. Foi com muito gosto que li, há alguns anos, as historinhas deste livro, tão sentidas, e sempre carregadas de graves valores morais. Uma destas histórias, "A menininha", termina com a simplicidade comovente deste parágrafo:
"Como Deus cobriu de esplendor e beleza a tarde do enterro! Setembro, rosa e ouro, como neste instante, declinava. Como vibravam os sinos naquele ocaso maravilhoso! Voltei pelo taipal, sozinho e triste, entrei em casa pela porta do cercado e, fugindo do convívio dos homens, encaminhei-me para a estrebaria e sentei-me, a recordar, com Platero..."
Não são histórias infantis, mas foram escritas sob uma inspiração infantil, como "O pequeno príncipe". Talvez seja a literatura mais difícil de se dominar.
Mais tarde, comprei o volume "Messidor", de Guilherme de Almeida, um poeta que eu já conhecia mas de quem o romantismo maduro e contido ainda estou descobrindo. No soneto "Amor, felicidade", encontramos a resignação de um mestre do verso:
"Infeliz de quem passa pelo mundo
procurando no amor felicidade!
A mais linda ilusão dura um segundo,
e dura a vida inteira uma saudade."
Ainda na mesma manhã, no ônibus, o celular de alguém tocou, de Mendelssohn, uma das "Canções sem palavras", aquela mais conhecida, e que é a mais luminosa.
Foi o bastante.