STF E AS PESQUISAS COM CÉLULAS-TRONCO
Eu não queria ser jogador de futebol, nem queria ser pagodeiro. Sempre fui assim meio impulsivo quando o negócio era ajudar outra pessoa. "Tem jeito pra Dotô" dizia minha vó, mas meu tio jogava água gelada: "cala boca, véia, ondi já se viu favelado virar médico, se muito vira gari".
Cresci com aquelas conversa na cabeça. Lutei muito para acabar o colegial e fazer o vestibular, sempre lembrando da minha vó, e quando o sono era muito e a vontade de desistir vinha com tudo, lembrava do meu tio: não iria dá esse gostinho pra ele. Nada contra os Garis, que efetuam uma das funções mais vitais da sociedade; mas eu queria algo mais, queria salvar vidas.
Pelejei para conseguir uma vaga em medicina, tentei três vezes entrar, mas sempre ficava atrás daquela lista de nomes japoneses - afinal, será que eles eram mesmo mais inteligentes ou o fato de terem seus cursos preparatórios financiados pelos pais e não terem que trabalhar das 8 ás 5 ajudou?
Foi pensando nisso que me deparei com os mistérios do cerébro, dos neurônios, do sistema nervoso e li pela primeira vez um artigo sobre as células-tronco. Fiquei apaixonado, e se aquilo tudo fosse verdade, um monte de gente que estava em cadeira de roda, poderia voltar a andar e todos aqueles vélhinhos com tremedeiras voltariam a ter uma vida mais digna. Até a minha vó, que começou a ter alzheimer seria beneficiada.
Finalmente descobrira o que queria ser: NEUROCIENTISTA!!!
Estudaria o sistema nervoso, a cabeça das pessoas, com todos os seus impulsos cerebrais e ajudaria, por meio das pesquisas, a encontrar uma forma de ajudar a Deus fazer esse povo voltar a andar e até pensar direito.
Passei em primeiro lugar no vestbular e apesar de, mesmo depois de formado, não conseguir fazer as pessoas entenderem o que é ser um neurocientista, sinto que estou no caminho certo. Esses dias, grata surpresa: fiquei sabendo que aquele curso de pós-graduação em células-tronco finalmente seria aberto. Fui um dos primeiros a me escrever, mas fiquei com receio que o curso não seguisse adiante por falta de pessoas. O coordenador explicou que muitos neurocientistas não queriam investir suas carreiras em uma área que corria o risco de se tornar ilegal: o governo e alguns padrecos ameaçavam proibir de vez, qualquer pesquisa relacionado a essas células. Ontem, recebi um e-mail do coordenador, dizendo que as incrições aumentaram, pois o Supremo Tribunal Federal liberou finalmente a pesquisa. Ufa!!! Quem sabe, eu e outros colegas, consigamos agora descobrir algo que possa ajudar a minha vó e outras tantas pessoas.
Maio 2008
Frank Oliveira
http://cronicasdofrank.blogspot.com/
Notas do autor: As células-tronco embrionárias são consideradas esperança de cura para algumas das doenças mais mortais. Elas podem se converter em praticamente todos os tecidos do corpo humano. Entretanto, o método de sua obtenção é polêmico, já que a maioria das técnicas implementadas nessa área exige a destruição do embrião. Para saber mais sobre a polêmica dessas pesquisas, consulte o link abaixo:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u378546.shtml