Traição virtual faz bem

Traição virtual é conceito individual. Como muitas mulheres da minha geração, eu acreditava que traição era traição e ponto (com ou sem br). Até que um dia a traição virtual revitalizou o meu casamento, obrigando-me a rever conceitos da infância. No fundo, todo mundo precisa de uma dose de fantasia de vez em quando.

Certas coisas precisam ser entendidas dentro do contexto. Era o ano de 2001 e eu estava envolvida com um novo e empolgante trabalho. Como felicidade raramente vem completa, a vida conjugal claudicava. O trabalho exigia viagens constantes e meu marido se ressentia do pouco tempo dedicado a ele e à família. Veja bem, entenda: diferente dos bancos, no casamento, o histórico do relacionamento conta pouco, o que importa é o agora. E o agora progredia para a tetraplegia: o que começou no “não importa o que eu faça, eu sempre volto para você” descambou rapidamente para o “você nunca me entende” e, morro abaixo, estava prestes a desaguar no “ se você não confia em mim, é melhor terminar tudo”. O clímax da crise ocorreu quando, em viagem, não telefonei para casa no nosso aniversário de casamento. Eu posso explicar: muito atribulada em um congresso em Boston, esqueci completamente a data. Nem deu para justificar, pois meu marido não mais atendeu as minhas ligações a partir de então.

Diz-se que a oportunidade surge em momentos de desconcerto. E desconcerto era pinto perto de como me sentia, no retorno para casa, alguns dias mais tarde. Até hoje, não sei como foi acontecer. No aeroporto em São Paulo, entrei na sala de embarque distraída. Num átimo, tive que reconsiderar todos os meus conceitos. Não foi premeditado, juro.

Não é bem o que você está pensando: Malu Mader, a diva maior dos sonhos do meu marido, lia uma revista, sentada na sala semi deserta dos que aguardavam o vôo da madrugada. Isso definitivamente não é do meu feitio, mas criei coragem, sentei ao seu lado e pedi um autógrafo. Simpática, ela escreveu uma pequena dedicatória no único papel que eu tinha em mãos: um livro do Arthur da Távola. Como sou tímida e arredia com estranhos e pouco afeita a tietagem explícita, aquilo representou uma grande prova de consideração, boa vontade e apreço. Muito feliz com o souvenir, ele esqueceu a bronca e aliviou o espírito prevenido.

Você, hein, vê maldade em tudo... Aposto como você entendeu tudo errado. O título da crônica foi só uma brincadeira sem conseqüências. Está lá no Aurélio: virtual é tudo que não existe como realidade. Traição virtual é, ipsis litteris, traição inexistente. Você há de convir comigo que a chance do meu marido e da Malu Mader viverem um caso amoroso é virtualmente zero. Calma, não foi culpa minha: na primeira frase do primeiro e do segundo parágrafo dei dicas do que te aguardava. Não fique bravo comigo: não consegui controlar meus instintos...

Assim comecei a driblar a crise do 14o. ano de relacionamento. Quem já passou por isso sabe que não é fácil, mas no fim, entre mortos e feridos, salvamo-nos todos. Em homenagem ao marco ( e para me redimir pela história real, mas bobinha) inseri neste texto 14 frases clássicas que saem da boca do “inocente” para justificar o injustificável. Você consegue encontrar todas?

Dizem que as crises no casamento ocorrem a cada sete anos. Ano que vem completo vinte e um anos de vida em comum. Talvez eu tenha que ir a Austin, no Texas, onde vive Sandra Bullock, a minha rival número 2. Dos males, o menor.

Maria Paula Alvim
Enviado por Maria Paula Alvim em 29/05/2008
Reeditado em 27/06/2008
Código do texto: T1011078
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