Há temporadas em que os sonhos não se deixam mostrar ao amanhecer e as noites são breves como pequenas interrupções do cotidiano. A vida sem as metáforas é gasta junto à monotonia de uma linha de montagem.
As folhas permanecem em branco.
Mas as estações se renovam e, sem perceber, o trilho exaurido de realidades dá espaço a uma passagem estreita e escura. Uma servidão poética, um atalho para a liberdade sem planos ou paredes. A trilha para os sonhos encravados entre as tantas construções. Um olhar de autor que assume a ação do personagem e interpreta as faces oblíquas dos atos falhos sem medo da vigília das contradições.
As noites são longas. Ressucistam algumas memórias e elaboram algumas falsas perspectivas. Muitas vezes encontro um processo impertinente abandonado em minha rotina, um caco de uma taça quebrada na véspera, mas estas realidades são fugazes e não comprometem o plantio das fantasias e a narrativa que brota com os desfolhar dos segredos.
É com o sorriso suspenso que acordo e escrevo a prosa dos dias. Permaneço folha – grávida – entre as linhas cerzidas.