Homofobia Mata

Pensei que hoje estaria escrevendo uma crônica maravilhosa sobre a Parada Gay. Estava cheio de planos, decidido a falar bem de todos, tendo em mente o conselho de um amigo: ‘a leitura deve dar prazer, acima de tudo’. Se bem que eu só acredito no prazer corpo a corpo, carne na carne. Mas nada custa tentar ouvir aos bons amigos.

Lá fui...

Já no metrô deparei com uma mulherada maltrapilha, corpo torneado à mortadela, vassoura e rodo, a soltar a franga - pra viado só faltava um pinto inútil entre as pernas; um gay escandaloso gritava que precisa sentar-se porque estava recém-operada, recém-mulher. Desconhecidos entreolhavam-se e riam um riso sem cor. Eu, à custo, mostrei os caninos carentes de dentista: a bicha não sábia fazer graça.

Desembarquei na República. Fui pegar um rodízio numa churrascaria popular (10,99). Fartei-me de carne assada e legumes. Fui subindo, lento, e nada se mostrava, exceto as caras diversas - tristes, sarcásticas, irônicas, divertidas, felizes - de uma multidão de milicianos a garantir a segurança. Por volta do Edifício Itália, um policial negro, forte, bigodão preto, escrutinou-me do pé à cabeça e coçou a mala volumosa. Desviei o olhar jogando-o lá na torre da igreja da Consolação.

Subi ao 10º andar do Copan, passei fio dental e escova nos dentes, liguei a tv e, para minha decepção, nenhuma noticia sobre a festa. Desci e fiquei em frente ao prédio, louco para enxergar, em policiamento, um amigo Tenente – amigo mais virtual que presencial. Nada! Não sei por que, mas ocorreu-me que alguns policiais colocaram suas piores fardas, as mais rotas ( ruptus) como se desejassem usá-las pela última vez, incinerá-las; em seguida, banhos de álcool e, para garantir, sal grosso e outros sais poderosos. Apesar da proteção de São Jorge, exorcizar é sempre bom.

Subi a Consolação lotada, carros de som e viados fantasiados de milhentas invenções. Um aglomerado atraiu-me... Aproximei-me e contei quinze viadinhos deitados uns sobre os outros, no meio da rua, todos se beijando entre si! Nunca vi aquilo na vida. Uma molecada entre 17/19 anos. Achei um exagerado, muito exagerado (ainda que fosse entre héteros). Mas, como é um dia de protesto, vá lá... Fica, entretanto, registrado que exagero não vale. Garanto que as ‘Mona chefe’ não concordam com isso.

Mais adiante, dois grandões, sarados, beijavam-se, avidamente, diante de um policial visivelmente constrangido! Fitei-o e o outro policial, ao lado, sorriu. Este estava leve e custava-lhe controlar o riso que escorria pelos cantos da boca. Aposto que estava ‘gozando’ o companheiro constrangido. Foi na cara deste ‘constrangido’ que quase li sobre a farda e banho de álcool. Foi o que me pareceu. Sabe como é: teoria é teoria. De repente poderia ser qualquer outro sentimento...

Ah, consternei-me com o prédio em franca decadência onde funcionava o Hotel Hilton. Era a única chance que havia, naquele lugar, de sentir outro cheiro que não urina. E foi só. O resto, fico devendo. Não falei mal; falei?