AGENDA DE UM FOLIÃO SEM MÁSCARA
Aqui vos fala, caro leitor rotineiro desta crônica semanal (ou, porventura, leitor adventício), um folião sem máscara, um folião retraído, sem história pessoal alguma para contar de outros ou de novos carnavais. Um não carnavalesco para quem os arrotos ou puns do Rei Momo nunca afetaram as narinas, e para quem os confetes jamais foram atirados e vice-versa. Isto porque, nunca me atraíram os salamaleques do Arlequim, da Colombina e de sua majestade o Momo. Sem nada absolutamente contra quem tais personagens prendem com seus encantos.
Que os decibéis do trio elétrico ou dos paredões de som invadam milhares ou milhões de tímpanos por aí afora, este folião prefere a cada ano a preservação de seu sossego e do amanhecer pacífico sob a batuta dos bem-te-vis e galos-de-campina festivos que alegram o quintal.
As festividades carnavalescas, para este folião acomodado, unicamente têm o condão de potenciar o prazer de releituras prediletas e contumazes, guiadas por autores daqui e dalém mar. Atrações silenciosas que nos fazem a alma pular de alegria.
Antes mesmo de Momo abrir suas cortinas e sair às ruas, já me encontro eu fazendo uma turnê por Macondo, admirando a solidão centenária dos Buendía (Holla, García Marquez!).
Pretendo também, nesse demorado interlúdio de cores e desfiles pelas ruas, voltar a dar um passeio pela região da Mancha, e lá reencontrar e dar um abraço no incansável e sonhador D. Quixote e seu desconfiado escudeiro. Almejo ainda fazer uma pequena excursão pela velha Lisboa do Eça de Queiroz, pelo Rio do nosso velho Machado, pela Fortaleza do nosso Zé de Alencar... de tal forma que, provocando o verso:
Prometo estar com tudo e em toda a parte
Durante os quatro dias de folia:
Dos sertões de Canudos, na Bahia,
À superfície do planeta Marte.
Na corte do eloquente D. Duarte,
Estrelas ouvirei em pleno dia;
E vou bater, repleto de euforia,
Na França do guerreiro Bonaparte.
Com Brás Cubas, no Rio, passearei.
Com Eça, vou voltar a Portugal.
Marília de Dirceu encontrarei
Distante no Brasil colonial...
Por isso, com prazer já reservei
Os livros para ler no carnaval!