A Proclamação da República: Mecanismo Político de Exclusão Social
Trabalhando no ambiente escolar é muito incômodo ter que ensinar a crianças e adolescentes a visão burguesa e de certo modo mítica sobre o processo de Proclamação da República do Brasil. Precisamos nos espaços públicos discutir de forma crítica e reavaliar os eventos históricos que construíram nosso país.
Na tal data, 15 de novembro de 1889, que pelo menos serve de feriado atualmente para o descanso, o Brasil varonil acordou sob um novo regime politico. A monarquia de Dom Pedro II (tirano que fugiu com a família do território nacional), que por tanto tempo reinara e impunha escravidão, foi derrubada por um golpe militar. Marechal Deodoro da Fonseca assinou o documento que proclamava a nova fase política.
Mas, essa mudança não veio das ruas, não foi o clamor do povo que ecoou nos salões do poder. Muito pelo contrário, os novos donos do poder (militares) arquitetaram tudo para terem suas benesses nas tetas estatais e alijou a sociedade desse processo - o povo assistiu embasbacado, distante, sem entender nada o que foi a tal instalação da visão republicana.
Foi uma revolução passiva, uma transformação de cima para baixo, feita por novos donos do poder e anti povo, onde as elites mantiveram o controle, adaptando-se às novas circunstâncias e sem romper com o tecido social existente. Essa mudança social se deu dentro da ordem, sem grande mobilização popular.
A República Velha, que se seguiu, trouxe consigo promessas de progresso. No entanto, para o povo, as mazelas sociais persistiram: o voto era manipulado pelos coronéis, obrigando os eleitores a votarem em certos candidatos, os tais direitos constitucionais não eram vivenciados pelo povo e a população negra (agora livre) tinha a "liberdade" de morar em barracos nas favelas e com baixa escolaridade e subempregos. Os trabalhadores continuaram a enfrentar a exploração, agora sob um novo manto. A estrutura de poder pouco mudou; a elite agrária mantivera sua hegemonia, enquanto a massa trabalhadora permanecia à margem, lutando por sobrevivência.
A Proclamação da República no Brasil foi um acontecimento social que não trouxe mudanças significativas para a estrutura social do país. Sem a participação popular e permanência dos interesses das elites, perpetuou a exclusão social e racial no país que apenas formalmente se dizia democrático e livre da escravidão. Mas que, na prática, com a ideologia do embranquecimento, jogava o negro na exclusão e o povo em geral no voto de cabresto, o qual era obrigado a votar nos candidatos dos coronéis. Ela não foi uma verdadeira revolução social, sim uma mudança superficial no poder político, mantendo as desigualdades e injustiças sociais que já existiam durante o Império.
A República, proclamada do alto escalão militar, não trouxe a emancipação para o povo. Foi uma resolução de cima para baixo, onde as decisões foram tomadas nos gabinetes, longe das vozes nas ruas. Já na sociedade de classes e no período democrático, a população ex-escrava não teve nenhum apoio do Estado ou da elite para melhorar suas condições de vida. Pelo contrário, nesse período prevaleceu a ideologia do embranquecimento – concepção que a elite escravocrata preferiu importar mão de obra europeia do que trabalhar com os negros locais. Para a população local ficou a exclusão – baixa capacidade técnica por falta de estudos, morando nas áreas mais periféricas das cidades (gerando o problema das favelas) e convivendo com as piores condições de vida.
Em tempos atuais em que a reforma trabalhista retirou diversos direitos trabalhistas, o Banco Central aumenta os juros para concentrar renda nas mãos dos banqueiros, parlamentares trabalham contra avanços sociais, como a discussão sobre a escala de trabalho 6x1, fica evidente que as estruturas dominantes nunca passaram por uma efetiva transformação e continuam a oprimir as camadas populares. Do início da República ao país redemocratizado, apesar de algumas conquistas sociais, permanecemos como uma massa sem ter a voz ouvida nos espaços do poder, seja por militares no final do século XIX ou por senadores e deputados em pleno século XXI.
14.11.2024