O marido jamais saberia o prazo de expiração da mãe... A esposa não desistiria de ser o centro das atenções do marido. Além disso, o amor matrimonial exigia cuidados especiais: carpe diem! Aproveitar o amor conjugal em detrimento do velho amor materno, que se tornara excessivo para um lar a dois. Não fosse a saúde debilitada da Dona Nita ou se esta tivesse ao menos uma aposentadoria para ajudar nos custeios da farmácia, mas não! Diante do problema dantesco, Rita esperou Zeca despedir-se da mãe com um abraço filial; conferiu as quatro paredes da sala e, como que o terreno estivesse livre, injetou indelicadezas nos ouvidos da sogra.

     Mãe de filho único, Dona Nita galgara a terceira idade com a triste constatação: não precisava de filhos agora, mas carecia de um ombro amigo, ou de, pelo menos, a atenção de cinco minutos para aliviar os ouvidos da Zulmira – boneca de pano e produto de sua solidão. Chega de trazer sofrimento para meu filho – pensou. Determinada, arrumou a mala: Zulmira, um vestido desbotado e uma calcinha. Partiu para um albergue distante dali. Seria feliz? Já fazia anos que ela nem sabia o que era sorrir de verdade.

     Instalou-se no Sênior Center – um triste jardim, cujas rosas exalavam o perfume do abandono. Recolhendo-se à ‘sua insignificância’ no mundo daqueles que têm pressa para ser feliz enquanto há tempo, contentou-se em dividir o quarto com a Dona Maria, vítima de Alzheimer. Ambas faziam companhia uma à outra, tricotando fantasias de um passado inexistente, tentando aquecer a brasinha de felicidade surgida no novo lar.

     Assim conheci Dona Nita – eu vestida de palhaça do grupo da Alegria, ela de desesperança. Desse encontro, desejei ser heroína e receber daquele rosto, petrificado pela indiferença, um sorriso sincero. Minhas inúteis tentativas levaram-me a chamá-la de mãe e, para não sair dali sem a sensação do dever cumprido, perguntei-lhe se gostaria de pedir-me alguma coisa. Suavemente seus efeitos faciais contornaram a cena, e ela sorriu:

     – Você me chamou de mãe?

     Ao confirmar, ela sorriu mais uma vez, mas não me deu resposta. Pela frustração do abandono, apenas disse que se eu pudesse sempre que possível fazer-lhe uma visita já que estava precisando tanto... Despedimo-nos num abraço – eu, ela e Zulmira. No silêncio, ela espera o retorno de uma alma leve e nova que acaba de sair do seu jardim.