O Trilho Abandonado da Ilusão
Há um tempo, o Brasil foi embalado por uma promessa: a de que o privado faria tudo melhor, de forma mais eficiente e moderna, em comparação ao setor público. Naquela época, lá pelos anos 90, o governo de Fernando Henrique Cardoso fez questão de vender essa ideia, e junto dela, vendeu também um pedaço da nossa história. Privatizou a Rede Ferroviária Federal. O resultado? Trilhos abandonados, trens sucateados, linhas desativadas. Onde antes o ferroviaço era sinônimo de progresso, hoje o que sobrou é silêncio e ferrugem.
O discurso era simples: o privado seria mais ágil, mais eficaz, menos burocrático. Mas ninguém mencionou o que, de fato, move o mercado privado — não é o interesse público, mas o lucro. E o lucro, esse voraz, nunca corre pelos trilhos que passam pelas periferias ou pelo interior esquecido do Brasil. O lucro não se interessa por garantir transporte digno aos mais pobres, mas sim por maximizar cada centavo. Quem se iludiu com essa promessa agora enxerga a realidade: os trilhos que restaram só ligam os pontos de maior interesse econômico, enquanto as cidades menores, outrora movimentadas pelos trens, ficaram à deriva.
O setor público, com todas as suas falhas e dificuldades, sempre esteve lá, mesmo que em estado precário. Ele é, no final das contas, a única rede de segurança para aqueles que não têm voz no mercado. Os hospitais públicos, as escolas públicas, os transportes públicos — com todos os seus problemas — continuam de portas abertas, ao menos tentando servir quem mais precisa. O privado, quando vê que o lucro não compensa, simplesmente fecha as portas. O setor público é imperfeito, sem dúvidas, mas é necessário. Ele está lá porque entende que sua função não é a de fazer dinheiro, mas a de servir.
No caso das ferrovias, a ilusão privatista foi desfeita pela realidade dos trilhos enferrujados. As promessas não entregaram. Mas o problema é mais profundo: quem acreditou que o privado sempre seria melhor fez isso com base em uma ideia vendida — e comprada — sem questionamentos. O pobre que ainda defende esse modelo é, na verdade, vítima de um discurso muito bem arquitetado. Ele acredita que o privado oferece um serviço de qualidade porque nunca teve acesso a esse serviço para sentir na pele as suas falhas. Quando o preço sobe, o serviço encurta, e a qualidade não vem, ele já está aprisionado na roda viva do mercado.
É hora de reconhecer a verdade: o público, com todas as suas falhas, é o que protege o que é de todos. Ele existe para atender quem mais precisa, e por isso, merece ser fortalecido, e não vendido. Afinal, quem hoje defende a privatização como solução definitiva talvez seja apenas mais um "idiota útil" que ainda não percebeu que o trem dessa ilusão nunca chegou ao seu destino.