O relógio
Existe um relógio antigo na estante da sala, um daqueles de madeira escura e ponteiros finos, que já não funciona mais. Ele parou há muitos anos, exatamente às três horas e quinze minutos de uma tarde que ninguém mais se lembra. O tic-tac cessou, mas o relógio continua ali, inerte, como uma testemunha silenciosa do tempo que já passou.
Curiosamente, ele nunca foi consertado. Talvez porque sua função tenha se transformado com o tempo: não mais contar as horas, mas lembrar que o tempo, esse senhor implacável, às vezes também precisa de uma pausa.
É engraçado como, em torno desse relógio parado, a vida continua a correr. As crianças cresceram, mudaram-se; a sala que antes era cheia de vozes e risadas agora parece serena, quase quieta. Às vezes, o vento balança as cortinas, e por um instante, o sol bate no vidro da estante, fazendo o velho relógio brilhar. Nesse breve segundo, ele parece querer dizer algo.
O tempo é uma coisa curiosa. Passa despercebido quando corremos entre compromissos, quando vivemos no automático. Mas, de vez em quando, é preciso sentar e olhar para o relógio parado. Há uma sabedoria no silêncio de suas horas congeladas, uma lição simples, mas valiosa: não é sempre o movimento que conta.
Talvez devêssemos parar mais, como o relógio. Deixar os ponteiros da vida descansarem um pouco, perceber que nem todas as horas precisam ser contabilizadas. Às vezes, as melhores lembranças estão nos momentos que decidimos não medir, apenas sentir.
O relógio parado na estante é um lembrete de que o tempo não se apressa para ninguém, mas nós podemos escolher como caminhar por ele. Talvez, no fundo, seja ele quem nos ensina a verdadeira importância de parar, observar e viver, sem pressa, cada segundo.
Angélica Lima