Banco da saudade - BVIW
Tema: sentimentos
Outro dia, passava numa estrada de terra batida, nas cercanias de Belo Horizonte, onde nunca tinha andado antes. O auto passava e meus olhos pregaram num banco de pernas compridas, ao lado de uma porteira de fazenda. Pra piorar, havia, ao pé do banco, umas margaridas brancas. Meu olhos marejaram… foi como se abrisse na minha lembrança a caixinha da saudade. Saudades de quando eu passeava com o vovô, a caminho da roça e via, miudinho, os mesmos bancos “pernas longas”, com seus latões de leite, pintados de barro vermelho por fora. Antes dos tanques de expansão, que são grandes refrigeradores nas fazendas leiteiras, era assim: depois da ordenha, à mão, o fazendeiro ou seu empregado, colocava as latas de leite na carroça ou nos burros e as levavam até o banco, ao lado da porteira da fazenda. Depois, o caminhão de leite passava na estrada principal, recolhendo o leite e entregando na cooperativa. Esse tempo, em que eu tinha um avô e uma avó, que me falavam ao coração coisas do amor, como proteção, cuidado, carinho, alegria, voltaram à tona quando vi o banquinho… Eu me queixei ao banco: Ô banco desalmado, como ainda está fincado numa outra era, num outro século? Como ousa me recordar coisas de menina mimada? Minha vida já andou por tantos caminhos e descaminhos depois disso, já me perdi e me achei, já me casei e descasei, já até me casei de novo, já cresci e apequenei tantos sentimentos puros e frescos de criança… Por que me aparece agora, sufocando-me, sacudindo a poeira do tempo? O que ganha com isso, porque eu mesma só me perco nos muitos sentimentos de dor, perda e saudades de um tempo que ficou guardado na gaveta da lembrança. Um banco sem sua lata de leite, uma mulher sem sua menina, uma menina sem seu avô… De repente, me senti devastada; se me traduzisse em uma paisagem, seria uma vastidão glacial, branca e gélida, por causa do banco, chave das lembranças de infância.