Face a face
Ela estava sentada no banco da praça, o rosto iluminado pela luz suave do entardecer. Havia algo de especial na forma como o crepúsculo brincava com suas feições, revelando um misto de tranquilidade e mistério. Parecia uma pintura viva, onde cada sombra e cada brilho desenhavam uma história. Não sei ao certo o que me atraía, mas havia uma inquietude em seus olhos, uma linguagem oculta que ia além do silêncio.
Aproximei-me sem saber o que dizer. Ela percebeu minha presença e, sem qualquer palavra, lançou-me um olhar que parecia conter uma vida inteira. Havia naquela expressão algo que me fazia sentir como se ela soubesse muito mais do que eu poderia imaginar, como se pudesse ver em mim coisas que eu mesmo desconhecia. Era um rosto que, em sua simplicidade, carregava um mundo.
O rosto dela me contava coisas, coisas que ela talvez nem soubesse estar revelando. Às vezes, sorria quase sem querer, e eu via um fragmento de alegria escondida, uma memória talvez, algo que a fazia vibrar por dentro. E quando o olhar desviava, eu sentia que havia ali uma história de desilusões que só ela conhecia. Seu rosto era um livro aberto, mas que, para ser lido, exigia a paciência de quem deseja entender cada linha, cada ponto final, cada entrelinha de silêncio.
"Você já parou para pensar no que o rosto das pessoas nos diz?", perguntei, quebrando o mistério do momento. Ela apenas sorriu de lado, como se já soubesse o que eu ia dizer antes mesmo de eu pensar. "A face humana é um universo à parte", disse-me, finalmente. "É a alma que aflora sem pedir licença, sem se esconder."
Aquelas palavras ressoaram em mim. Ela tinha razão. Havia faces que acalmavam, como a dela. Rostos que nos desarmavam, outros que nos feriam. Olhos que nos desafiavam e olhares que pediam permissão para entrar. E, naquele instante, senti que eu queria descobrir mais sobre o que a sua face dizia — queria decifrar aquele mistério, entender a calmaria e o turbilhão que se alternavam em sua expressão.
Sentamo-nos ali, lado a lado, enquanto o sol se punha. Não precisávamos de palavras, pois suas expressões falavam por si. Seu rosto, a cada nova nuance, parecia me contar sobre as manhãs que amanheceu esperançosa, as tardes em que a nostalgia a visitava, as noites que varou à espera de algo ou alguém.
E eu? Eu ali, apenas, querendo decifrar cada detalhe daquele enigma chamado face humana. A dela, entre todas, era a que eu queria entender. Porque sabia que, uma vez desvendada, talvez ela me revelasse também um pouco de mim.