Entrevista imaginária com Agnes

Nelson Rodrigues fez algumas entrevistas imaginárias. Por que não posso fazer o mesmo? Ele entrevistava num terreno baldio sempre acompanhado de uma cabra vadia, gafanhotos, sapos, corujas, caramujos e minhocas. A entrevista que fiz teve como cenário uma praia deserta em dunas de areia, na companhia dos cardeais, quero-queros, bicos-de-lacre, canários, bem-te-vis, borboletas e flores. Meu plano de ação é mais, digamos, romântico.

Não que eu esteja apaixonado pela moça que entrevistei. Uma moça de quinze anos, loira, olhos verdes, linda.

- Você acha seu nome, Agnes, bonito?

- É lindo. Ainda mais que significa pura ou dócil como cordeiro.

Tem também a história bonita de Santa Agnes, nascida em Roma. Ela foi morta aproximadamente aos 13 anos, por ter recusado o desejo do filho do governante de Roma. Milagrosamente escapou intacta às chamas, sendo assim decapitada. Só fico um pouco triste quando vovó e um tio me chamam de Agnex. Às vezes vem com dois e até três xis: Agnexxx. O sotaque carregado de xis é coisa de manezinhos. O tio, da Ilha de Santa Catarina e a vó, de Antônio Carlos, mas vive Há bastante anos na ilha.

As marolas faziam um barulho lembrando música suave que emanava paz no ambiente.

- Você gosta dos seus parentes?

- Adoro o jeito que me tratam. Tenho um tio muito tímido, que sempre me trata sempre bem, carinhoso. Outro, por não ter filhos, me trata como se fosse filha. Alugava cama elástica nas festas quando eu era criança. É um amor de tio. As tias cozinham bem e tenho até medo de engordar. Todos são ótimos. Uma tia faz doces, bolos, para vender na cafeteria, mas, de mim, nada cobra e traz os melhores quitutes para que eu saboreie.

- E os avós?

- Impossível alguém ter avós melhores que os meus. Sou substituta de primas que já são mulheres formadas e a única genuinamente loira entre as mulheres. Meus olhos são parecidos com o do vô Aroldo. São idênticos aos do meu pai e minha mãe, que é muito mais bonita que eu.

- Você, com esses olhos sedutores, tem namorado?

- Sou muito jovem para coisa séria. E olha que papai e mamãe me dão liberdade, desde que cumpra certas regras, que obedeço. Por enquanto os jovens não me atraem, parecem muito irresponsáveis.

Quero estudar, trabalhar, ter um futuro que me realize e deixe meus pais orgulhosos.

- Quais são seus sonhos?

- Ser feliz toda a minha vida. Sei que terei alguns contratempos, mas quero tirar de letra os obstáculos que aparecerem.

- Foi muito bom conversar contigo. Com estes teus olhos da cor da esperança, desejo que consigas tudo o que pretendes, por mais atribulada que seja a vida. Tudo é possível se tiveres Deus e o amor no coração. Agnes, não “negas” o exemplo familiar que carregas.

Conheço teus pais, tios, primos, avós. São todos, sem exceção, exemplos a serem seguidos. Que Deus ilumine o teu caminho!

Explico “negas” entre aspas: porque difere de Agnes somente na posição das letras.

Logo que acabamos a entrevista, escutamos o barulho do Bloco Skentaí. Os pássaros e as borboletas voaram assustados.

O vento dissipou os morros de areia e despetalou as flores. Em seguida, desfilaria o Bloco Rosa. Botamos nosso bloco na rua e cada um foi para casa, curtir os parentes.

Aroldo Arão de Medeiros

03/02/2017

AROLDO A MEDEIROS
Enviado por AROLDO A MEDEIROS em 28/10/2024
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