Nessa longa estrada da vida tive que fazer algumas paradas para consultas a psicólogos e, inclusive, numa curva mais acentuada, a um psiquiatra. Não tenho nada contra analistas da mente humana que consideram desnecessário o tratamento quimioterápico para as perturbações mentais. Contudo, no que me diz respeito, tendo-me sobrevindo esta tal de crise existencial, só consegui retomar o norte com a ajuda psicológica de um bom psiquiatra e dos remédios que ele, competentemente, me receitou.
Foram mais de três anos de um bate-papo semanal em seu consultório e de receitas de fármacos de tarja preta. Passado esse tempo, chegou um dia em que me dei conta de que nada mais tinha a dizer ao meu psiquiatra. Esgotara o meu repertório de lamúrias, as quais ele, pacientemente ouviu durante aquele tempo todo. Ele, à sua vez, quem sabe também já estivesse cansado de me dizer, nas entrelinhas e subentendidos, que a vida é assim mesmo: um combate que aos fracos abate, mas que aos fortes e bravos só pode exaltar!
Assim que, findo meu tratamento psicoterápico, seguimos nossas existências, ele como o competente psiquiatra que sempre foi, além de bom e carinhoso pai de família, e eu como advogado de causas tributárias de empresas, e já então um orgulhoso avô de três netos.
Pois esse amigo partiu para sempre; foi de repente, não mais que de repente. Estando ele no hospital e eu num Shopping Center, ligou-me para dizer-me que naquele dia mesmo, num sábado, passaria por um procedimento médico delicado, com vistas ao tratamento de uma incipiente leucemia, cuja cura ela dava como certa. Nunca mais nos falaríamos.
Foi então que vim a lembrar-me que, numa das minhas sessões de terapia com ele, durante as quais também havia lugar para discussões literárias, referi-lhe aquela frase de William Faulkner: entre a dor e o nada, prefiro a dor. Carlos Alberto Sampaio Martins de Barros não sofre mais as dores deste mundo, e no outro, certamente haverá de ter encontrado, não o nada de Faulkner, mas a vida plena que Deus reserva a pessoas boas e humanas como ele.
Notas
1. Nessa longa estrada da vida é a frase inicial de uma música “brega”, muito conhecida, da dupla Milionário e José Rico;
2. Um combate que aos fracos abate mas aos fortes es aos bravos só pode exaltar o é do poema I-Juca Pirama de Gonçalves Dias;
3. Não mais que de repente é um verso da canção poema Soneto de Separação de Vinicius de Moraes;
4. Entre o Nada e a Dor, prefiro a Dor é uma das famosas frases do escritor norte-americano William Faulkner.