O Silêncio dos Justos e a Voz dos Versículos Isolados

Sentado no banco de madeira de uma igreja qualquer, um fiel respira fundo e folheia a Bíblia em busca de respostas. Ele para no verso de 1 Coríntios 1:27: *“Deus escolheu as coisas loucas deste mundo para confundir as sábias”*. É seu mantra, seu refúgio, e agora, sua justificativa. Afinal, como explicar o apoio inabalável a um líder político que parece a antítese dos valores que Jesus pregou?

Aos olhos desse fiel, tudo faz sentido. A mensagem é distorcida para servir à narrativa: o “louco” é um enviado divino, um tipo de profeta moderno em missão de guerra contra o comunismo, as pautas progressistas, e tudo aquilo que desafie o conservadorismo. A lógica é confortável, simples. Pouco importa que o "louco" tenha governado com descaso pelas vidas perdidas na pandemia, com ataques às minorias e com um discurso corrosivo de ódio. Tudo se justifica na ideia de que Deus usa até os imperfeitos — ou, nesse caso, os que flertam com o abismo moral — para realizar Seus propósitos.

Mas, agora, diante de escândalos e provas inegáveis, o silêncio começa a surgir entre aqueles que antes gritavam nas redes sociais. A notícia de conspirações para eliminar os líderes eleitos, incluindo ministros do STF, abala até os mais fervorosos. Ainda assim, não falta quem diga que tudo não passa de perseguição ou armação do "sistema". Os pastores, mestres na arte de oratória, reorganizam o discurso: "Estamos sendo provados. Só os verdadeiros fiéis continuarão firmes."

E assim, os crentes mais fanáticos continuam obedientes. Não à palavra sagrada, mas à palavra do líder político que foi santificado por seus pastores. Eles se ancoram na ideia de que o bolsonarismo combate uma ameaça invisível, personificada no “comunismo” — um espantalho usado para manter a ignorância e alimentar o medo. Essa fantasia de um Brasil “conservador” nada mais é do que a manutenção de privilégios, do poder concentrado, enquanto as massas acreditam estar defendendo “tradições”.

Pobres e ricos, unidos por uma ilusão coletiva, seguem alimentando a máquina que beneficia os líderes religiosos e políticos que os manipulam. Minorias continuam sendo perseguidas, o discurso de ódio continua sendo disseminado, e os valores que Jesus pregou — como amor, compaixão e acolhimento — são esquecidos.

E, quando questionados, o que dizem agora? Muitos preferem o silêncio, esperando que o tempo apague a vergonha. Outros se agarram a novas teorias conspiratórias, num ciclo sem fim de justificativas. “É tudo um teste de fé”, dizem. A verdade, no entanto, é clara: fé mal direcionada não transforma. Ela oprime.

O que resta é a esperança de que um dia os olhos se abram e os ouvidos escutem o verdadeiro chamado do Evangelho: não aquele que confunde para manipular, mas aquele que ilumina para libertar.

Sandro Almeida
Enviado por Sandro Almeida em 20/11/2024
Código do texto: T8201434
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