CARTA ABERTA AO SENHOR PUM
Prezado Senhor Pum,
Venho por meio desta, com o devido respeito, dirigir-me ao Senhor — um velho conhecido meu, embora nunca tenhamos sido formalmente apresentados. Sei que, por razões profissionais, sua rotina não permite fixar endereço. Entendo que sua presença, às vezes sutil como um sussurro de vento, outras vezes estrondosa como a chegada do Papai Noel num carro alegórico da Sapucaí, torna-se imprevisível. Aliás, desconfio que o bom velhinho também seja um de seus clientes mais antigos.
Mas vamos ao ponto.
Vivemos na era dos carros que estacionam sozinhos, foguetes que dão ré, chips que traduzem idiomas e astronautas que vão ao espaço e, vez ou outra, são esquecidos por lá. Ainda assim, com todo esse avanço, ninguém conseguiu criar uma tecnologia capaz de prever que tipo de Senhor Pum está por vir.
Isso é grave.
Há quem aja de má-fé, eu sei — gente que solta o Senhor em ambientes fechados e finge uma inocência digna de Oscar. Mas a grande maioria é apenas vítima. Ludibriada. Enganada. Um falso alarme. E quando menos se espera, o Senhor aparece em um trio elétrico no volume máximo, daqueles que fazem as caixas de som ferver, em tempo de bater o motor do gerador e derreter os tweeters.
É justo?
O Senhor há de convir que vivemos em comunidade. Aquela fase de home office já passou. As pessoas voltaram a habitar elevadores, salas de reunião e ônibus lotados. Seria salutar, por parte da sua ilustre gestão, implantar um sistema de aviso prévio, para dar tempo à evacuação do ambiente (no melhor sentido, é claro).
E aproveito para fazer um apelo especial: evite os elevadores. É desnecessário querer mostrar serviço em espaços tão pequenos. Não há glória nesse tipo de aparição. O Senhor não precisa provar nada pra ninguém.
Contando com sua habitual imprevisibilidade,
Subscrevo-me.
Atenciosamente,
Um cidadão traumatizado, porém esperançoso.
RESPOSTA DO SENHOR PUM
Prezado amigo de tantos anos,
Recebi sua carta. Desculpe a demora na resposta — é que minha vida está uma merda. Desde a chegada da minha sogra aqui em casa, desandou tudo. Tenho terceirizado muitos serviços; essas tarefas de menor monta, como bufa, solinha boba de moça e de vegano, passei para um escritório de um conhecido meu.
Aqui comigo ficaram apenas aqueles casos que merecem atenção especial, dentre os quais se enquadra a sua solicitação. Vamos lá:
Quanto ao aviso prévio: esse sistema está ativado desde a queda da pastilha. Talvez, pela correria do dia a dia, vocês não tenham notado o estranho chegando. Pois bem — é o aviso. Basta contrair um pouco os músculos que a vontade volta após 30 minutos. Tempo suficiente para você sair da casa da namorada.
Agora, eu e minha equipe não temos culpa se os músculos do amigo estão fora de foco ou em estado de saturação. Hoje, aí onde você vive, a medicina já estica rosto — pode perfeitamente fazer uma reparação muscular da válvula fresada. É um procedimento rápido e que vai melhorar, e muito, esse problema.
O amigo pode até perguntar:
“Mas, Senhor Pum, fica como novo?”
Eu respondo: Novo, novo mesmo não. Mas fica em um estado aceitável.
Depois fale com o meu apoio, que eles lhe passam uma lista de profissionais qualificados para tal intervenção cirúrgica.
Sobre o problema nos elevadores:
Meu amigo, você já fez uma lista de tudo que comeu em um dia? Hein?... Responda! Agora você fica na fila do elevador já sentindo que o aviso prévio foi dado, joga sua sorte nas mãos de Deus — e a culpa é minha?
Meu amigo e usuário, tenha — veja bem — aquele pum que você solta, que parece um corvo em decomposição, pode ser no Tirol, que a relva morre na hora! Come sarapatel, galinha à cabidela, feijão tropeiro, fava... e quer que eu tome conta da situação?
Não. A responsabilidade é sua. O que eu te aconselho: muita água e repouso. E da próxima vez que for me perturbar com pedidos dessa magnitude, coloque a mão na consciência e veja se, com a sogra que eu tenho, ainda preciso desse trabalho.
Contando com sua compreensão,
Subscrevo-me.
Atenciosamente,
Sr. Pum