A estranha morte de Reinaldo Azevedo

Era uma vez um homem. Um homem de verbo afiado, mente livre e coração conservador. Escrevia com raiva, mas uma raiva lúcida, daquelas que limpam os olhos da opinião pública. Era contra o PT com argumentos, contra o estatismo com estatísticas, contra o populismo com pitadas de filosofia. Enfim, um gladiador das ideias.

Mas eis que o tempo passou. E como dizem os românticos tardios: “o tempo muda tudo”. Só esqueceram de dizer que o tempo, às vezes, muda até os neurônios de lugar.

Hoje, esse mesmo homem — sim, aquele que via em Lula uma ameaça civilizacional — agora o vê como o guardião da democracia. Sim, meus caros, guardem bem esta pérola: Lula, o democrata. O mesmo que aparelhou o Estado, desmoralizou instituições e fez da Petrobras um cofrinho para financiar a revolução dos camaradas — virou, de repente, o Churchill de Garanhuns.

E por que essa mudança tão terna, tão doce, tão... conveniente?

Segundo alguns, Reinaldo “amadureceu”. Entendeu que “o inimigo é outro”. Que, diante do ogro bolsonarista, qualquer criatura bípede que não grite “mito!” virou estadista. Foi tocado, talvez, por uma luz progressista vinda das colunas da Folha, ou quem sabe por um sopro de ternura das redações que agora lhe servem cafezinho quente em nome da “frente ampla”.

Ah, a frente ampla... Essa entidade mística que absolve pecados passados, santifica escândalos e transforma estelionatários ideológicos em mártires do Estado de Direito.

Claro que não se trata de adesão. Imagina! Reinaldo, garantem seus fãs, continua crítico. Crítico como um gato castrado: miando aqui e ali, mas sem causar incômodos. Um rebelde domesticado, vestido de tweed, oferecendo análises “técnicas” para justificar o injustificável. O antigo terror dos petistas virou... um pai de santo da tolerância lulista. Basta que o governo manche o teto de gastos com feijoada e Reinaldo aparece com incenso e discurso sobre “contexto histórico”.

Não me admira que alguns — que antes o odiavam com o fervor de um seminarista inquisidor — agora teçam loas à sua “coerência”. Pois sim, coerência! Eis a palavra da moda para quem muda de lado sem sair do lugar. Dizem que ele se desiludiu com a Lava Jato. Claro, é compreensível: a operação teve seus excessos, como prender corruptos e mostrar recibos. Um verdadeiro escândalo. Para os paladinos da hipocrisia, lutar contra abusos virou sinônimo de livrar os abusados.

Mas voltemos à figura do nosso protagonista. Reinaldo agora é um homem ponderado, que fala baixo, elogia Alexandre de Moraes com a devoção de um monge tibetano, e parece ter descoberto que a corrupção petista era, na verdade, apenas “governabilidade atrapalhada”. Quase uma obra incompreendida de arte moderna.

Lamento informar, leitores, mas a voz crítica morreu. Não foi assassinada. Morreu de causas naturais: pragmatismo, ressentimento e vaidade intelectual que, ao contrário da vaidade física, só aumenta com o tempo. Em seu lugar ficou um colunista domesticado, desses que já não mordem, apenas latem para quem não usa pronome neutro.

E quanto aos que ainda o seguem? Esses, ah... esses merecem uma crônica à parte. São os neófitos da coerência de boutique, que defendem Lula com argumentos que aprenderam (Adivinhem?) com o Reinaldo antigo. A ironia é tanta que sinto falta de ar.

Por isso, encerro aqui este velório. Não com tristeza, mas com o riso cínico de quem vê o teatro e já conhece o final. Que descanse em paz, Reinaldo. E que seus leitores e ouvintes saibam distinguir entre evolução e rendição.

Elias dos Santos
Enviado por Elias dos Santos em 15/04/2025
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