Família Preguiça
Pedro, Luísa e os filhos Francisco, Antonio e Juana formam a família Rivas que vivem, ou seria residem, na Venezuela. Os nomes foram escolhidos pela bióloga Luz Alvarez.
Todos são conhecidos popularmente por preguiça, bicho-preguiça e cabeluda. Animais de pelagem longa, vivendo na copa das árvores e se alimentam dos frutos da embaúba, da figueira, da ingazeira. Embora possam habitar em diversas espécies de árvores, elas preferem, mesmo, a embaúba que, bem por isso, é também conhecida como árvore da preguiça.
Certo dia, Pedro mandou os filhos construírem um mundéu para caçar paca, afim de a saborearem com sarapatel. Para quem não sabe o que é mundéu, vou explicar o que pesquisei no Google, uma vez que eu também não sabia. É simplesmente uma armadilha de caça.
Depois de quase dois meses de trabalho, pois quando trabalhavam pela manhã, durante duas horas no máximo, folgavam à tarde e vice-versa, tudo naquela lentidão que lhes é peculiar, concluíram a armadilha. Foi só então que Pedro lembrou-se que a família não comia paca e, por incrível que pareça, nenhum outro animal. Suas refeições são apenas frutos, folhas e a seiva de algumas árvores.
Ocorreu algo parecido com um português na composição de
Wilson Miranda:
O telefone tocou pro Manuel
E o Manuel saiu armado e foi pra Niterói
Mas na viagem ele refletiu
Na consciência nada me dói
Não sou Manuel, não sou casado, eu sou Joaquim
O que é que eu vou fazer em Niterói?
Mas Joaquim que é a favor da economia
Aproveitou esse boato, fez a barba e deu uma voltinha
Pois lá em Niterói é tudo mais barato
Pelo menos Joaquim saiu ganhando, já a família Rivas perdeu tempo e se cansou.
Os bichos-preguiça raramente descem ao chão. A cada sete dias abandonam a moradia para fazerem as necessidades fisiológicas.
A família Rivas, como é muito mais preguiçosa que as outras da mesma espécie, fazem as necessidades vitais de cima da árvore mesmo. Os machos justificam para a matriarca terem medo que uma cobra possa mordê-los.
Ainda bem que esse animal é um dos poucos mamíferos que vive sem precisar de água, porque a quantidade necessária do líquido para a sobrevivência é absorvida dos alimentos, folhas e frutos. Se houvesse necessidade de descer das árvores para se alimentarem, provavelmente essa raça já teria sido dizimada.
Até na comunicação, eles uniam as palavras, ou suprimiam as últimas letras, para não gastarem energia à toa, em vão. O diálogo entre eles é mais ou menos assim:
A filha conversando com o pai.
- Oncovô pará pai?
- Jú, vai ali – aponta e continua – é perdicasa.
Mãe num diálogo com o filho Antonio.
- Tono popô um pouquin pra mim?
Antonio se mexe para pegar um punhado de folhas e por pouco não se estatela no chão e resmunga:
- Quascocaio.
Francisco e Juana em rara conversa:
- Jú, arreda um tiquim prálá.
Juana impaciente responde:
- Chico, o quecequé? Mandrião.
Isso me reportou à infância e lembrei-me de algo que aconteceu com o amigo João Batista. A mãe pediu para ele:
- Tita, vai na venda e compra uma perna de linguiça. Não esquece de cumprimentar o dono da venda.
Tita, obediente, foi e falou:
- Dia! A mãe quer uma perna de lingui.
- Seu Acésio, falou, pacientemente:
João Batista, porque não falas uma perna de linguiça?
- Eu tô com pregui.
Na selva venezuelana acontece de vez em quando o progenitor da família Rivas comentar:
- Nessa época de calorão, tem dias que bate aquela preguiça!
- Mas não é que eu fique relaxado, só gosto de descansar antes de ficar cansado...
E tem mais essa, Francisco aconselhando os irmãos mais novos:
- Dizem que a preguiça é mãe de todos os vícios! E mãe é mãe, a gente tem que respeitar!
Pois bem, podem acontecer no mato ou na cidade essas histórias e causos, portanto...
...Como muitas vezes é possível ver em filmes, faço uso nessa crônica, com a devida adaptação, de frase esclarecedora:
“Qualquer semelhança com alguma família humana, é mera coincidência”.
Aroldo Arão de Medeiros
22/09/2023