Falta de leitura

Quem lê pouco comete erros crassos que envergonham quem estiver ao seu lado. Alguns nem podem ser considerados erros, porque já estão no, digamos, dialeto manezês.

Por exemplo: “Surraxco” (churrasco), “cair um tombo” (cair ao chão, de frente), “bergamota” (vergamota), “cardosa” (sardinha), “chimia” (pasta doce feita de ovos para passar no pão), “coisa tola” (pessoa tola, sem graça), “escaldado” (pirão bem cozido na água quente), “fato” (bucho, dobradinha), “guerra” (garra do siri ou do caranguejo), “camaçada de pau” (surra).

Existem palavras para as quais não há desculpa para falar errado. Então, depois de anotar a maioria falada por certa pessoa, contarei uma estorinha caseira, para melhor exemplificar.

- O vizinho está de carro novo, sabias?

- Não.

- Qual é a marca?

- É um “Collant”.

Depois de muito quebrar a cabeça, o marido descobriu que era um Logan.

Ela pensou um pouco e continuou a conversa:

- Ele deve ter dado uma boa grana para adquirir esse carro, pois ainda teve que vender o “Fox” (ô) para concluir a aquisição.

O casal resolveu fazer reforma na edícula e ela, que manda e não pede, determinava desta maneira: Quero isso assim, aquilo assado, “entedesse”. A “partileira” colocaremos no lado direito para dar espaço à geladeira e aos outros eletrodomésticos. Não esqueça de contratar um bom eletricista para trocar todo “fuzil” que estiver queimado. Não quero que falte luz, pois volta e meia está dando “pânico” na eletricidade. O “rufi” tem que ter proteção para os passarinhos não fazerem ninho. A madeira a ser usada tem que ser de “gergelim” (angelim), para evitar que dê cupim. Depois de tudo montado, fizeram um almoço com a família para comemorar a inauguração.

Ela ariou todas as panelas de “inox” (ô).

Quando o filho mais velho chegou, perguntou-lhe:

- Tu “truchesse” a “mox muxcada” que pedi que comprasses no supermercado? Como os “goxtos” são diferentes, “fisx” três tipos de conduto. Podem deixar que não vai ter “figo” de boi nem “almôniga”.

A sobremesa, quem vai fazer são as noras. “Vocêx” que sabem o que será melhor para os meus filhos. Comida tem “bastante”, não vai faltar, com certeza. Coloquei “chuchi” (sushi) para realçar o sabor. Na salada coloquei algumas gotas de “azeite de Olívia”. Agora vamos rezar. Todo mudo “calaaboca”.

Se ela fala assim tão errado, não foi por falta de estudo. Ela tem o segundo grau completo e não estudou na escolinha do Baldoíno.

Todos a obedecem, rezam e a vida segue. Eles sempre gracejam dela, de seu modo de falar, mas todos a amam como se ela fosse uma mãe-rainha, tia-rainha, sogra-rainha e assim por diante.

Fazendo uso da frase de Neem Karoli Baba, os filhos deveriam dizer:

MÃEEUTEAMO

Desse jeito mesmo, sem vírgula, sem espaço e sem ponto final

Aroldo Arão de Medeiros

18/11/2018