GÊNESIS DE MINHAS LUXÚRIAS - Por Gleisson Melo

Muito confessei até agora. Mas no que mais pequei serei enxuto. Não quero discorrer aqui sobre minha longeva vida luxuriosa. Pois dela não me arrependo. Do começo ao fim, numa trajetória exponencial deleitei-me com os prazeres dos sentidos. Recebi e dei prazer, dentro, fora, por cima e por baixo do que pede a sã doutrina. Fui fiel, a mim diga se de passagem. Casei quatro vezes e nas quatro oportunidades meu tino forte de homem não suportou a casta e regrada vida de marido correto. Então voltei as origens, a casa da luz vermelha, sempre que a burra tinha dinheiro ou a dispensa tivesse mantimento. Fui lascivo da juventude a terceira idade da última idade. Quando me faltaram as forças do órgão natural, me vali da língua, dando-lhe nova função além de seu natural caminho pecaminoso pelas vias da gula. Filhos, assumi-os todos. E muito me valeram nesse final de vida. Frutos do amor ao ato de amar.

Não me arrependo. Cumpri a legitima ordem da natureza, para gozo meu e de quem me ajudou na missão. Não me arrependo. Mas porque confessares se não há arrependimento? Condição “sine qua non” para o perdão via absolvição. Digo e respondo: apenas para que se complete meu quadro confessionário a beira de minha final peregrinação terrestre quase centenária.

Mas como minha vida luxuriosa dá panos para mangas, resolvi confessar apenas a gênesis de minha besuntada vida. Quem sabe contando apenas o início, as gêneses de tais caminhos lancinantes, possa receber a indulgência que me deixará cândido a merecer o céu.

Foi oral, minhas primeiras expressões luxuriosas, mas revestidas de minha inocência da primeira infância. Levava tudo a boca. E por que? Ora bolas, pelo prazer. Do colosso aos mordedores, e brinquedos de meus primeiros meses de vida, tudo era levado a boca por puro prazer. Pergunte ao Freud, ele explica bem essa fase oral. Mas bastou eu crescer um pouco, como menino que nasci, tive minhas primeiras provocações lascivas na pré adolescência. O ambiente masculino cobra-nos muito a tal macheza, que passa por desejar, sem pudor, as lascívias experiências da vida. Visualmente, pelo cheiro e pelo toque. Pedro meu amigo de arapucas e estilingues não cansava de me mostra, empolgado, o galo cobrindo a galinha, ou toro a vaquinha e um besouro outro inseto em seus íntimos momentos de cumprir a ordem de crescer e multiplicar.

Eu tinha, no começo, um sentimento pudico perante essas coisas, fruto dos dizeres que eu mal entedia do Tio Alberto que era pastor. Mas para me sentir pertencente a ala dos meninos homens olhava e fazia farra junto sem nem mesmo entender bem aquilo. Época de cio de cachorro Paulo me chamava para acompanhar os bichos em sua colundria de orgias caninas. Não entedia bem, mas ia junto pra fazer farra de menino. Quando um macho demorava cobrindo a pobre cadela jogávamos água e muitas gargalhadas.

Menino mais grande na idade, já vinha as cobranças em conversas cheias de nuanças luxuriosas. Se já tínhamos iniciado, se já tinha visto mulher pelada. Eu sempre afirmava que já tinha visto. Eu via a prima Lia pelada quando dormia em minha casa. Como? Espiava pelo buraco da porta. Confesso que nessa idade, não via muita graça naquilo de espiar a prima pelada. Não entendi abem as coisas. Mas quando contava para os amigos, isso dava autoridade e respeito. Era coisa de homem. Tínhamos momentos de compartilhamento de revistas. Nunca esqueci dos seios da Cida Marques. Juntávamos num campinho ou atrás de um barranco pra poder ver o proibido estampado em preto e branco e as vezes em colorido papel.

Minha irmã, quase da mesma idade era super protegida, num recato celestial, tanto pela minha mãe como pelo meu pai e algumas tias enxeridas. Mas comigo não, fora Tio Aberto e Tia Tonha que volta meia davam-me um sermãozinho casto, era cobrança mesmo, dos amigos, da turma do colégio, dos primos e dos tios. “Tu já faz cinco contra um meu filho!?” “Já tem documento grande?” Quantas vezes ouvi essas perguntas que eu nunca sabia como responder. Era um teste? Ficava eu a pensar. Mas além da cobrança do meio, já brotava junto com os primeiros pelos um desejo mesmo de me entregar ao mundo dos sabores sensuais. E por falar em pelo, tinha sempre um na turma a passar nódoa de bananeira na pélvis, no saco e nos sovacos querendo acelerar a inevitável condição de homem maduro.

As meninas chatas que nem sempre dávamos bola nas brincadeiras infantis, passaram a ter uma áurea diferente. Não sabia explicar, mas era bom de olhar, de sentir o cheiro, de tocar. Mas ao mesmo tempo o jogo invertia, se corríamos dela, agora elas corriam da gente. Eita!, eram muito recatadas ou tinhosas mesmos. Tinha sempre uma a provocar e fugir. Nunca esqueci de Margarida, ia na minha casa, já era moça formada no corpo, mas cabeça de menina. Brincávamos de casinha, eu seguia tudo que dizia. Já dava ordens vejam só, uma inauguração do futuro. Margarida era morena, bonita. Mas Tia Tonha vivia chamando-a de assanhada. Mal entendia o que vinha a ser isso. Certa vez Tia Tonha a escorraçou de minha casa. Pois a mesma pediu pra deitar com ela no chão, obedeci inocente. Tia Tonha chegou junto, igual árbitro de futebol para marcar uma falta no time que ele torce de coração. Veio com sangue nos olhos e fogo na boca. “Vai se embora daqui assanhada”, gritou como se expulsasse o próprio demônio. Depois disso só via Margarida de longe, com meus olhos de gato pidão.

O tempo passou, e com nódoa ou sem nódoa já senti o corpo amadurecendo, os pelos crescendo junto com o desejo natural de um tiquinho de lascívia. Quando meu pai percebeu, cutucado pela minha mãe, que já estava em idade de mocinho, já tocando o terror sozinho. Ele veio conversar comigo. Nunca esqueci a frase pronunciada como liturgia. “Sábado tu vens comigo num lugar que vou te levar. Se arrume como homem.” Meu pai falava pouco. Mas essa fala foi solene.

No sábado, com roupa de “vê-deus”, fomos no nosso fusca num lugar estranho. Um casa grande, fora da cidade, com muita luz e música. Meu pai calado apeou do carro. Segui-o e fomos rumo a casa de luz vermelha, de cheiro de cigarro, de copos girados e muita gente rindo. Só podia ser lugar bom de ficar, pensava eu menino. Alguns me olhavam, outros riam e tragavam seus cigarros. Moças dançavam, outras se sentavam acariciando alguns homens. Papai não dizia nada. Daí aproximou-se uma moça cheirando leite de rosas e me tomou de meu pai. Não falei nada, tomei sua mão, olhei meu pai que ascendia um cigarro e fui. No quarto fui iniciado. Com mulher de verdade, não era bananeira, não era novilha, nem cinco contra um, foi com mulher mesmo. “De combinação mais bonita que da prima Lia quando dormia lá me casa.”

Estava eu no dia seguinte, orgulhoso, contando aos meus amigos.

Gleisson Melo

ESCRITORES E CIA
Enviado por ESCRITORES E CIA em 31/10/2024
Código do texto: T8186194
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