DM

Já vi que algumas siglas têm significado especial, como DNA e PVC. Segundo a cultura popular, DNA é Data de Nascimento Avançada e PVC é a Porcaria (para não usar palavrão) da Velhice Chegando. Ambas estão associadas ao peso dos anos, coisa que a maioria dos homens não admite, oxalá as mulheres.

Ao bater papo com peões de uma empreiteira, eles falaram que o Berto, o Mineiro e outros que eu não conhecia eram DM. Fiquei a imaginar o que significava aquilo e não conseguia ligar as letras a algo que decifrasse minha dúvida. Não me contive e perguntei o que significava. Qual não foi minha surpresa com a resposta:

- DM é Dinheiro Morto, ou seja, pessoas que não merecem o salário que recebem.

Pensei cá com meus botões: Berto e Mineiro são mesmo DM e dão motivos suficientes para serem assim alcunhados.

Berto foi contratado para ser encarregado de turma, mas como dizem os peões, seria um bom servente. Quem lhe garante o bom salário é o seu irmão que é o mandachuva da firma. Já Mineiro não é parente do chefe-mor, mas é amigo de longa data e além de dar abrigo a ele, também aguenta qualquer besteira que seu filho Batista fizer.

Analisando os fatos pude perceber que todos nós estamos rodeados de DM e que no Brasil não se pode dar murro em ponta de faca, pois o sistema e a cultura não nos deixam corrigir a situação.

Na empresa em que trabalho há dois sujeitos que são dinheiro morto e até enterrado de tanto não fazer nada por merecer o ordenado. Antônio e Chico são ambos engenheiros: um não faz nada de producente o dia todo e o outro o ajuda.

Antônio coloca a desculpa de sua improdutividade na depressão atestada pelos médicos. O problema é que tira vaga de alguém que quer trabalhar, produzir e sustentar família. Finalmente parece que vai aposentar por invalidez e abrirá uma vaga na restrita concorrência.

Chico fica o dia todo traduzindo alemão. Esquece que é bem brasileiro, não almeja conhecer aquele país e já está em fim de carreira para lecionar ou servir de tradutor. Tem o melhor salário de todo o departamento, porque é o mais velho e o numerário é distribuído não por competência e sim por tempo de empresa. O que os garante na empresa e lhes dá toda mordomia é a garantia de emprego que foi conseguida na luta de quem trabalha e faz jus ao que recebe. Para não ficar só nessa desculpa, vale lembrar que Antônio veio com uma turma de seu estado e que não sei se por competência ou política pegaram os melhores cargos, chegando até a diretores.

Quem dá guarida ao Chico é seu irmão João que, além de ex-funcionário, foi vereador e tem força política na empresa.

Voltando às empresas que prestam serviços terceirizados, atacamos de Gildemar. Ele é encarregado geral, seu salário é maior do que de outros que tem a mesma função e lhe dão um banho de competência. Gildemar na obra servia para levar marmita para os peões no campo, mas o salário sempre estava em dia. O que leva a crer que quem o garantia, era o chefe de recursos humanos que devia levar o seu para defendê-lo tanto e garantir o emprego qualquer que fosse a situação.

Como derradeiro exemplo chegamos ao Gonzaga. Sua função, garantir o bom andamento do canteiro de obras, cuidando da cantina, do escritório e das admissões, demissões e permanência dos empregados. Coitado do Gonzaga, em toda saída que dá do escritório passa num boteco e toma um copinho de pinga. No computador é um zero à esquerda e quem garante o bom andamento é sua auxiliar. Em certa obra recebeu o apelido de Boi Ralado porque só servia no almoço carne moída.

Deixemos, porém, seus predicados negativos e diremos quem garante o emprego. Seu irmão é diretor e, apesar da vergonha que passa, não o deixa desempregado e ainda lhe dá asilo em sua casa.

Chega de fofoca e eu torço para não ser chamado de DM. Quero ser reconhecido como DV (Dinheiro Vivo), e assim, serei lembrado como alguém que, por menor que seja a fração, contribuiu para o progresso desse imenso Brasil.

Aroldo Arão de Medeiros

08/07/2006