Crocrodilando no Pantanal
Em uma excursão ao Pantanal, tudo o que diz respeito às atividades sociais e às fofocas sobre as pessoas que participaram desse evento, foram repassadas por um amigo meu, o colunista social Bipolar, figura brincalhona e muito observadora. Contou fofocas que só ele percebia, pois Bipolar é um espectador atento a tudo que acontece ao seu redor.
Esse crítico satírico de jornal relatou-me que um dos colunáveis, isto se simples músicos saíssem nas colunas sociais, comprou uma Viola-de-Cocho.
O instrumento musical recebeu este nome por ser confeccionado em tronco de madeira inteiriço, esculpido no formato de uma viola e escavado na parte que corresponde à caixa de ressonância. É feito da mesma maneira como se faz um cocho, objeto lavrado em um tronco maciço de árvore e usado para alimentar animais na zona rural. A Viola-de-Cocho foi reconhecida como patrimônio nacional, registrada no livro dos saberes do patrimônio imaterial brasileiro em dezembro de 2004. Esse multi-instrumentista aprenderá a usá-la e fará grandes apresentações junto aos amigos.
Pudemos também ver de perto as ariranhas ou lontras-gigantes. Pegamos jacaré na mão. Não adianta mentir, mas o filhote não media mais que vinte centímetros e Bipolar me contou que alguns se borraram de medo ao segurar um que, pelo tamanho, teria somente alguns dias de vida (não passava de 10cm).
Havia duas irmãs muito alegres. Ambas viúvas e a mais velha se sobressaía pelo comportamento festeiro. Se minha mãe fosse viva, diria que ela é assanhada, cu de fogo, rabo aceso. Eu digo que ela é tudo isso, não literalmente falando, pelo amor de Deus. Com ela sempre se está sorrindo, pois para essa mulher a tristeza pediu passagem e foi embora. Nas animações comandadas pelo recreacionista era a que mais aparecia. A irmã, às vezes, saía de perto para não passar vexame.
Havia duas outras bem diferentes. Cabelos e vestidos compridos que as identificavam como mui religiosas, daquelas que cumprem exatamente o recomendado pelo pastor. Com o sol forte, as duas resolveram tomar banho de piscina. Não titubearam e entraram na água para se refrescar, embora usando vestidos.
Duas figuras que chamaram a atenção de todos foram dois senhores com quase noventa anos de idade. Gêmeos univitelinos estavam acompanhados de um dos filhos, sexagenário. Os “meninos”, assim eram chamados os idosos, sadios, eram os primeiros na saída para a caminhada e também os primeiros a retornarem. Ao serem perguntados pelo filho e sobrinho se haviam se cansado, ambos respondiam: nem um pouquinho. Já o acompanhante dos dois reclamava o tempo todo de dores nas pernas.
Todo momento eram solicitados a tirar fotos com todas as mulheres. Umas apenas curiosas, outra para mostrar para os filhos também gêmeos, e algumas, viúvas como eles, com interesse.
Nem tudo são rosas quando alguém não quer que seja. Uma mulher, conhecida como depressiva, andava pelos cantos fumando e mexendo no celular. Pouco falava com as pessoas e deixou mais de uma a falar sozinha quando alguém lhe perguntava algo. Pelo menos fotografou bastante e se esforçava para sorrir, nem sempre conseguindo, quando fazia pose para ser fotografada.
Dois homens não se desgrudavam, como os gêmeos, eram dois amigos. Era uma amizade colorida, pintada com as sete cores do arco-íris.
Tudo o que é bom um dia acaba. O meu informante disse que ouviu da irmã mais nova da festeira:
- É uma pena, mas vamos ter que voltar para o borralho.
Nunca pensei em escutar tal palavra. Tive que pesquisar e descobri: borralho são as cinzas quentes que restam no fogão a lenha depois de apagado o fogo... Essa mulher mora em apartamento, mas por certo se lembrou dos idos tempos em que residia no sítio e a cozinha tinha um fogão a lenha.
Antes de chegarmos ao aeroporto, a orientadora, descendente de japoneses bela e simpática, falou ao público dentro do ônibus:
- Bom dia. Quero que gravem meu nome, Tatiana, mas podem me chamar de Tati. Esperamos ter feito um passeio excelente, que possa servir de boa recordação para vocês, filhos, netos e amigos. Se tiverem algumas dúvidas perguntem, não se omitam. Tentaremos explicar da melhor maneira possível o que estiver ao nosso alcance.
Depois de cinco dias vou colher informações através de um formulário, para avaliar como foi nosso trabalho. Escrevam a verdade, mesmo que sejam críticas, pois será bom para podermos melhorar. Não ajam com falsidade para nos agradar.
Espero não sentir que estão usando de crocrodilagem, crocrodilando. Não quero ver vocês jacarezando.
Aroldo Arão de Medeiros
27/09/2012