Os 7 “Nãos” e a arte de recomeçar

A segunda-feira chegou com seu fôlego pesado de rotina, dessas que acordam antes do sol e arrastam os minutos como quem carrega um saco cheio de pendências. Entre um café amargo e uma notificação de cobrança no celular, vi um bilhete esquecido sobre a mesa. Nele, em letras tremidas de quem escreve com o coração, estavam listados os 7 “Nãos” da semana. Um pequeno manifesto de sobrevivência diária.

Li o primeiro: Não reclame.

Difícil, pensei. Logo eu, que cultivo queixas como quem rega samambaias. Mas, por teimosia ou desafio, aceitei o convite. Passei o dia tentando trocar as reclamações por respiros. Reclamar menos é observar mais. Notei a cor bonita da blusa da vizinha, o cheiro de bolo escapando da padaria e, pela primeira vez em semanas, ouvi minha própria respiração.

Não critique.

Esse me pegou desprevenida. Porque criticar é quase um reflexo. O cabelo da moça, a escolha do outro, o jeito que alguém atravessa a rua. Mas, quando parei para pensar, percebi que cada crítica é um espelho virado para mim. Por que me incomodo tanto com o que não me pertence? Resolvi guardar os dedos apontados e abrir as mãos para os encontros.

Não julgue.

Difícil não julgar quando a gente mal entende a si mesma. Mas, naquele dia, preferi imaginar que cada pessoa que cruzava meu caminho carregava uma história que eu jamais saberia por completo. E isso foi libertador. Julgar menos é permitir-se surpreender mais.

Não se sinta incapaz.

Essa frase me encarou como quem sabe dos meus bastidores. Dos dias em que escrevo e apago, das tentativas de ser forte quando tudo que queria era sumir debaixo do cobertor. Mas a capacidade não mora nas conquistas grandiosas; ela se esconde nos pequenos passos que ninguém vê. Levantar e seguir já é prova suficiente de que posso.

Não olhe para o ontem.

Fui tentada a questionar. Como não olhar? Ontem é matéria-prima de quem escreve. Mas percebi que o conselho não era para esquecer, e sim para não me prender. Ontem é uma gaveta aberta. O hoje é a chave para trancá-la sem culpa.

E, acima de tudo... não deixe de ter fé em Deus.

Fé foi o que me restou quando tudo faltou. Fé é um sopro, uma luzinha miúda que se acende no escuro. Não é sobre religião, é sobre acreditar que há propósito até no dia que desmorona. E, por mais que as horas me desafiem, é essa fé que me costura e me reconstrói.

Terminei a semana com o bilhete gasto de tanto dobrar e desdobrar. E percebi que, por trás de cada “não”, havia um “sim”.

Sim para a leveza. Sim para a empatia. Sim para a coragem. Sim para o presente. Sim para a esperança. Sim para mim. Sim para Deus.

No fim, os 7 “Nãos” não eram proibições, eram libertações disfarçadas. Uma lista que, ao invés de me prender, me ensinou a voar.

Nêrilda Lourenço
Enviado por Nêrilda Lourenço em 28/02/2025
Código do texto: T8274592
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