Kairós - BVIW
No livro Em Busca do Tempo Perdido, de Proust, o protagonista, já adulto, relembra sua infância a partir do sabor que sente ao comer uma madeleine embebida no chá. Gatilhos como esse nos despertam sentimentos, emoções boas ou ruins, armazenadas em nossa memória e aparentemente esquecidas.
Somos afetados por um aroma, um sabor, um som, que ligamos a algum fato ou a alguém. A mim, por exemplo, o aroma e o sabor do café recém coado, me transportam ao lar, ao aconchego, ao carinho. O perfume de dama da noite me lembra de uma casa em que morei e da qual sinto saudade.
A vida é feita de uma soma de momentos não lineares, prazerosos ou dolorosos, que provocam em nós sentimentos vários, emoções contraditórias. A memória nos leva a resgatá-los, a revivê-los, em uma viagem guiada por Kairós, o deus grego do tempo circular. Voltamos e voltamos ao passado, buscamos nele nossa identidade, nossa singularidade, nossa biografia.
Talvez por isso, sobretudo quando idosos, contemos tantas vezes as mesmas histórias. É Kairós que nos arrasta, ainda que não o queiramos...