A Vida em Quintais

Crônica: A Vida em Quintais

Em um mundo que gira apressado, onde as horas parecem se espremer entre as responsabilidades e os compromissos, há um canto tranquilo e esquecidamente mágico que pode ser encontrado nos quintais. Essas pequenas parcelas de terra, que por vezes se tornam refúgios ou simplesmente estão à sombra da correria cotidiana, guardam histórias e memórias que merecem ser descobertas.

Eu me lembro do quintal da minha avó. Era um mini ecossistema em que a natureza fazia sua festa. Havia um pé de abacate, cujos galhos dançavam com o vento; um pé de alecrim, que exalava um aroma que me trazia lembranças de comidas caseiras e reuniões em família. Nas manhãs ensolaradas, a luz do sol se filtrava pelas folhas, criando padrões de sombra e luz que mais pareciam obras de arte natural.

A vida no quintal era simples e, ao mesmo tempo, extremamente rica. Enquanto as crianças brincavam entre os brinquedos improvisados — cordas, gravetos e imaginação — os mais velhos se sentavam em cadeiras de balanço, contando histórias que pareciam eternas e atemporais. “A vida é como um pé de laranja-lima,” dizia meu avô com seu jeito sábio, “tem suas frutas doces, mas também as azedas e as espinhosas. É preciso aprender a aproveitar todas elas.”

E assim, naquele espaço que era um microcosmo de vida, aprendia-se muito mais do que em filas de escola ou livros didáticos. A vida ali era despreocupada e fascinante, um ciclo que se repetia ano após ano. A cada estação, um novo recomeço: no verão, as plantas floresciam em exuberância; no outono, as folhas caíam, simbolizando a beleza do desapego; no inverno, a calmaria trazia um descanso necessário antes da explosão da primavera.

Esse drama cíclico nos ensinava sobre esperança e renovação. As colheitas de frutas eram seguidas por dias de risadas e compotas caseiras, e cada visita ao quintal trazia uma nova lição. Os pássaros cantando, o vento soprando, até mesmo as brigas entre as formigas — tudo ali era uma mercearia de experiências que nos guiava por sentimentos inexplorados.

Contudo, os anos foram passando, e o quintal da minha avó foi deixado para trás, assim como os momentos despreocupados da infância. As casas se tornaram prédios e a natureza foi perdendo espaço para o asfalto e a poluição. Mas, como um poço de lembranças, o quintal permanece vivo dentro de mim. A vida, com suas complexidades, desafios e alegrias, agora se manifesta nas pequenas coisas: numa flor que nasce no meio do asfalto, em um canto de riso compartilhado entre amigos, ou numa tarde de sol.

Assim, a vida nos ensina que, embora mudemos e o mundo ao nosso redor se transforme, sempre haverá um quintal em nosso interior, onde podemos voltar às raízes da simplicidade e da essência. Basta parar, olhar para dentro e recordar que a magia está nas pequenas coisas, e a vida, por mais apressada que seja, é sempre um convite para apreciar o que realmente importa.

Vera Salbego

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