Listas

Como diz um listador, listas são a poesia dos metódicos, o exercício dos inquietos, o consolo dos sonhadores. Elas não mudam o mundo, não pagam contas, não nos engordam nem nos emagrecem, mas servem perfeitamente para momentos de inatividades, de tédio improdutivo. São minha forma particular de dizer ao tempo "Para", embora saiba de antemão a resposta para o pedido.

Listas! Na ânsia vã de vencer o invencível, elaboro listas: aleatórias, cruzadas, de férias, listradas, existenciais, práticas, improváveis. Ao fim, reúno-as todas em uma única lista: a lista de mim, e me decepciono bastante, ao chegar a uma espécie de espelho banal, onde cabem as coisas que nunca fiz, as que gostaria de ter feito, as que provavelmente não farei.

Para listar apenas três das mais listáveis, destaco as aleatórias, as existenciais e as práticas. Nas listas aleatórias, como o próprio nome sugere, listo fatos e coisas duvidáveis, duvidosas, incertas, casuais, acidentais, tipo "Coisas que eu deveria estar fazendo em vez de criar esta lista: 1. lavar os pratos empilhados na pia. 2. aprender aritmética básica. 3. varrer a calçada. 4. repetir os itens 1,2 e 3"; ou "Nomes que não combinam com bebês, mas sim com árvores: 1. Magnólia. 2. Marisol. 3. Camélia"; ou "Palavras que soam melhores do que significam: 1. caleidoscópio – palavra cheia de cores e movimentos, mas que, no fim, é apenas um tubo com pedaços de vidro; e aventura – que soa épico, mas pode ser apenas uma ida à padaria com um tropeção no meio do caminho".

Gosto substancialmente das existenciais, porque me parecem sugerir mais na teoria que na prática. Por exemplo: "Coisas que me deixam acordado às 2h da manhã: 1. excesso de sono. 2. procurar entender a mensagem sublimar por detrás do miado dos gatos brigando no telhado. 3. um pensamento aleatório sobre como seria a vida sem a presença constante e regulatória do FMI."; ou "Medos que eu tinha aos 4 anos e que ainda fazem sentido hoje: 1. medo de bala perdida. 2. de mulher bonita. 3. de Lobisomem.", ou "Sons que eu gostaria de engarrafar: 1. o som do riso de um/a amigo/a. 2. o som da brisa do mar. 3. o som de uma latinha de cerveja ou refrigerante abrindo."

Por sua vez, as práticas são bem práticas. Exemplo: "Atividades cotidianas improrrogáveis: 1. ler e-mails. 2. beber água. 3. tomar banho.", ou "Kit de sobrevivência básica: 1. carregador de celular extra. 2. lentes de contato ou óculos reserva (para aqueles que, feito eu, somos míopes). 3. chaves reservas (para os casos de perda das originais); ou "Kit de Emergência Doméstica: 1. repelente para insetos. 2. urso de pelúcia antiestresse ou plástico bolha. 3. serra elétrica, de preferência".

Na vasta coleção de listas que acumulo, cada item, portanto, representa uma tentativa frustrada de vencer o invencível; uma busca por sentido, por algo que justifique o gesto mecânico (ou nem tanto) de pensar, de escrever, de organizar, de listar.

Em meio a este tédio provável, vem alguém e me sugere que eu deva ver "O Auto da Compadecida 2". A recomendação é interessante, e talvez realmente me faça bem. Talvez eu deva suspender provisoriamente a elaboração constante de listas, de busca pelo não-feito. Talvez, quem sabe, eu realmente encontre em "O Auto da Compadecida 2" uma lição mais profunda sobre a natureza da existência. Vou, então, assistir para ver.

Damião Caetano da Silva
Enviado por Damião Caetano da Silva em 12/01/2025
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